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O PAGAMENTO DE SALÁRIOS DOS DIAS PARADOS EM DECORRÊNCIA DE GREVE E A "CORTESIA COM CHAPÉU ALHEIO"

Luiz Vicente de Carvalho Cargo Autor1 Carlos Eduardo Dantas Costa Cargo Autor2 Área do Direito: Trabalho

I - Contextualização Como consequência da grave crise econômica na qual o país está imerso, temos visto e vivido, nos últimos meses, uma nova onda de acirramento das relações coletivas de trabalho. De um lado, como é da natureza humana, trabalhadores buscam a melhoria de sua condição social, pleiteando, junto a seus empregadores, aumentos salariais, além de novas garantias e benefícios. De outro lado, os empresários, agora espremidos ainda mais pelo cenário político-econômico (retomada da inflação, disparada do dólar, instabilidade política), fazem lembrar dos malabaristas de pratos, tendo de revelar habilidades circenses, na difícil arte do empreender e veem-se, de modo legítimo, impossibilitados de atender às reivindicações que lhes são feitas, por vezes, sob pena de inviabilizar a própria continuidade do negócio. Como saldo disso - e com imensa contribuição de uma estrutura sindical falida, que produz, em regra, lideranças despreparadas e alheias às questões do mundo que as cerca - cresce, tanto em número de ocorrências quanto na intensidade do confronto, a quantidade de movimentos grevistas em todas as atividades e segmentos econômicos. Citam-se, como exemplos recentes, a greve nacional dos bancários; dos funcionários do INSS; dos servidores da Justiça do Trabalho e dos docentes em instituições federais, dentre outras, cujas reivindicações e forma de cobrança nem sempre se mostram razoáveis... Até aí, nada de novo ou muito diferente. A questão torna-se relevante e atual, porém, à vista de uma crescente corrente no Poder Judiciário, que condiciona a legalidade da realização, pelo empregador, do desconto dos dias parados à verificação da abusividade, ou não, do movimento paredista. Em outras palavras: vem crescendo no Poder Judiciário Trabalhista o entendimento segundo o qual o empregador somente pode efetuar o desconto dos dias não trabalhados durante a greve, caso essa seja declarada (judicialmente) abusiva. Nesse sentido, apenas para melhor evidenciar o ponto aqui levantado, vale transcrever acórdão recente, proferido em julgamento ocorrido no Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (São Paulo), que analisou movimento paredista ocorrido em "empresa da iniciativa privada"1: "(...) DECLARO A GREVE NÃO ABUSIVA, ficando garantido o pagamento dos dias parados. Esclareço, por oportuno, que o reconhecimento da greve como não abusiva, leva ao enquadramento do movimento paredista como mera interrupção do contrato de trabalho, uma vez que o movimento praticado pelos trabalhadores dentro dos limites da lei, inexistindo razão para que a classe trabalhadora seja prejudicada em razão do exercício regular de um direito, repita-se, constitucionalmente garantido, razão pela qual não deverão ser descontados os dias da paralisação (...)." (destacamos)2 A tendência ora mencionada é vista por nós com grande preocupação e é com esse pano de fundo que passaremos a tecer comentários acerca da obrigatoriedade do pagamento dos dias não trabalhados em decorrência de greve.

II - Considerações legais acerca do pagamento de salários dos dias de greve O sistema legal atual apresenta evidente diferença quando comparado ao anterior, no que diz respeito ao pagamento dos salários dos dias de greve. Antes, os salários eram devidos caso atendidas as reivindicações, no todo ou parte, quer diretamente pelo empregador, quer por decisão da Justiça do Trabalho.3 Na legislação vigente a participação em greve, ainda que legítima4 (vale dizer: pouco importa a verificação acerca da abusividade, ou não, do movimento grevista), "suspende o contrato de trabalho, devendo as relações obrigacionais, durante o período, ser regidas pelo acordo, convenção, laudo arbitral ou decisão da Justiça do Trabalho"5. Quisesse o legislador que os salários fossem pagos no período do movimento grevista, teria estabelecido tratar-se a hipótese de interrupção, na qual há a sustação da prestação dos serviços, mas permanece a obrigação do empregador relativa ao pagamento dos salários, a exemplo do que se verifica no afastamento do trabalho por motivo de doença ou acidente, por até 15 dias. Sendo a greve, portanto, hipótese de suspensão (coletiva) do contrato de trabalho, a consequência jurídica imediata é que deixam de subsistir, temporariamente, as obrigações decorrentes do vínculo empregatício e, dentre elas, notadamente o pagamento de salários. A lógica, aqui, é muito simples: não havendo prestação de serviços, não há de se falar em pagamento de salários6. Nada mais evidente. Não é por outro motivo, senão para suportar a ausência de salários durante a greve (consequência jurídica da suspensão do contrato de trabalho), que o legislador assegurou aos grevistas, dentre outros, "a arrecadação de fundos" (Lei 7.783/89, art. 6º, II), para fazer frente às necessidades dos trabalhadores. Embora a teoria aqui criticada venha ganhando força, ainda se verifica, nos julgados trabalhistas, a ratificação do posicionamento por nós defendido. Vejamos: "PAGAMENTO DOS SALÁRIOS CORRESPONDENTES AO PERÍODO DE GREVE. Prevalece nesta Seção Especializada o juízo de que a paralisação dos serviços em decorrência de greve importa na suspensão do contrato de trabalho, nos termos do disposto no art. 7º da Lei 7.783/89, razão por que, não havendo trabalho, independentemente da qualificação jurídica da greve, o empregador não está obrigado a efetuar o pagamento dos valores correspondentes ao período não trabalhado, salvo situações excepcionais. Precedente do Supremo Tribunal Federal no mesmo sentido. Hipótese em que a Corte Regional declarou 'a inexigibilidade da obrigação do suscitante de pagar os salários no período de greve aos seus empregados que a ela aderiram', fundamentando-se no art. 7º da Lei 7.783/89." (TST - Processo nº Processo Nº TST-RO-198-91.2011.5.05.0000 - Ministro Relator Fernando Eizo Ono - Publicado em 21.11.2014). Greve é, inquestionavelmente, um direito fundamental do trabalhador. Porém seu exercício pressupõe uma tomada de decisão e a assunção de um risco que é, salvo acordo em sentido contrário, o não pagamento dos salários relativos ao período da paralisação. Isso porque o direito de greve sustenta-se na permissão legal para que o trabalhador não cumpra a principal obrigação inerente ao seu contrato de trabalho, que é a prestação de serviços. Nessa mesma direção, não havendo a prestação de serviços, não se poderá exigir do empregador o pagamento dos salários, afinal, não há como se impor somente a uma das partes o cumprimento da obrigação que é bilateral. Sendo a greve o momento de maior tensão das relações coletivas de trabalho, é necessário que as partes tenham ciência dos riscos a ela associados: para a Empresa - o prejuízo econômico da ausência de produção; para o trabalhador - a possibilidade do não recebimento do salário relativo ao período da paralisação.

III - Considerações Finais e Conclusão Além de tudo quanto fora apresentado, vale ressaltar que o próprio Poder Judiciário, quando figura na condição de "vítima" de movimentos grevistas, tem adotado postura - para dizer o mínimo - contraditória em relação a esse entendimento segundo o qual o pagamento dos dias parados tem a ver com a abusividade da greve. Cabe esclarecer, nessa linha, que em sessão ocorrida no dia 25 de agosto de 2015, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) editou enunciado nos seguintes termos: "A paralisação dos servidores públicos do Poder Judiciário por motivo de greve, segundo jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e deste Conselho Nacional de Justiça, autoriza o desconto da remuneração correspondente (Lei 7.783/89), facultado ao Tribunal optar pela compensação dos dias não trabalhados". Ora, aí está a consagração máxima do ditado popular "fazer cortesia com o chapéu alheio": o Estado, quando é juiz, impõe à iniciativa privada o pagamento dos dias parados e, quando é parte, autoriza o desconto dos salários. É imperioso que as empresas tomem conhecimento das considerações que, em brevíssimas linhas, buscamos apresentar, não para que possam descontar os salários de seus empregados que, por ventura, venham aderir a movimento grevista - ninguém espera que uma empresa tenha como fonte geradora de riquezas o não pagamento de salários - mas, sim, para que o exercício desse direito seja levado a efeito de forma séria e responsável, por trabalhadores que estejam igualmente dispostos a assumir os riscos daí decorrentes.

1 Destacamos, propositalmente, a expressão "empresa da iniciativa privada" para, mais adiante, contrapor ao tratamento conferido pelo Poder Judiciário em greves feitas pelos seus próprios servidores. 2 Dissídio Coletivo de Greve nº 1000605-25.2015.5.02.0000 - TRT 2ª Região - Acórdão Publicado no DEJT em 08-09-2015. 3 Lei 4.330/64 - Art. 20. A greve lícita não rescinde o contrato de trabalho, nem extingue os direitos e obrigações dele resultantes. Parágrafo único. A greve suspende o contrato de trabalho, assegurando aos grevistas o pagamento dos salários durante o período da sua duração e o cômputo do tempo de paralisação como de trabalho efetivo, se deferidas, pelo empregador ou pela Justiça do Trabalho, as reivindicações formuladas pelos empregados, total ou parcialmente." 4 Lei 7.783/89. Art. 2º. "Para os fins desta Lei, considera-se legítimo exercício do direito de greve a suspensão coletiva, temporária e pacífica, total ou parcial, de prestação pessoal de serviços a empregador." 5 Art. 7º, da Lei nº 7.783/89. 6 Salvo situações excepcionalíssimas, como na hipótese de o empregador contribuir decisivamente para a deflagração do movimento grevista, como no caso do atraso no pagamento de salários ou descumprimento de obrigações contratuais

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