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COVID-19: PROTEÇÃO DA VIDA E DA ECONOMIA SOB A ÓTICA DOS DIREITOS HUMANOS

Atualizado: 2 de out. de 2020

Área do Direito: Direitos Humanos Resumo: Os desafios trazidos pela pandemia da ­Covid-19 ultrapassam a barreira sanitária. As medidas de segurança ao redor do globo foram as mais variáveis, incluindo o distanciamento social, com drásticas consequências econômicas para os grupos mais vulneráveis. Este artigo visa discutir as melhores formas para a proteção da vida e da saúde, sob a ótica da interdependência dos direitos humanos. Palavras-chave: Covid-19 – Distanciamento social – Direitos humanos – Interdependência Abstract: The challenges posed by the Covid-19 pandemic go beyond the health barrier. Security measures around the globe were the most variable, including social distance, with drastic economic consequences for the most vulnerable groups. This article aims to discuss the best ways to protect life and health, from the perspective of the interdependence of human rights. Keywords: Covid-19 – Pandemic – Social distancing – Human rights – Interdependence Sumário: 1.Introdução


1.Introdução

A Covid-19 traz uma série de novos desafios para as sociedades contemporâneas. A necessidade de se reestruturar é inerente ao ser humano, sobretudo em tempos que se exigem maiores mudanças sociais. A crise sanitária mundial afeta diversos direitos humanos, como vida, saúde e trabalho, sendo necessário pensar a sua proteção em conjunto com os reflexos econômicos da pandemia.

Em 30 de janeiro de 2020, a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou que o surto da doença causada pelo novo coronavírus (Covid-19) constitui uma Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional. E, em 11 de março de 2020, a OMS caracterizou a Covid-19 como uma pandemia, isto é, uma doença endêmica (por atingir um grande número de pessoas) que se espalha por diversas regiões do mundo.

No Brasil, o Decreto Legislativo 6, de 20 de março de 2020 (LGL\2020\2715), reconheceu a ocorrência do estado de calamidade pública, com efeitos até 31 de dezembro de 2020, nos termos da solicitação do Presidente da República encaminhada por meio da Mensagem 93, de 18 de março de 2020 (LGL\2020\2478).

É importante refletir acerca das medidas de proteção e dos limites das restrições jurídicas impostas para o enfrentamento do novo coronavírus. A Covid-19 não comporta barreiras territoriais, alastra-se por quase todos os países do mundo, não atingiu apenas determinado grupo social e possui caráter intersetorial, mas suas consequências mais drásticas alcança as pessoas mais vulneráveis.

Apesar da necessidade de adoção de medidas extraordinárias, a Covid-19 desencadeia ameaças ao Estado Democrático de Direito, já que o estado de calamidade pública não pode se transformar em um estado de exceção, com a concentração de poderes no Executivo, o aumento da intervenção militar na sociedade, a regressão de valores democráticos e retrocessos à efetivação dos direitos humanos.

Foi utilizado para a elaboração do presente artigo o método dedutivo, consubstanciado no exame de normas jurídicas, livros, artigos científicos e precedentes judiciais. Por meio de um procedimento dialético, o artigo pretende analisar os desafios para a proteção direito à vida, inclusive pelo seu aspecto econômico, em razão dos impactos sofridos pelos grupos mais vulneráveis, com enfoque na situação que se encontra um número elevado de trabalhadores informais na América Latina.

Isso porque o vírus não discrimina, já que atinge a todos – independentemente da condição econômica –, mas seus impactos são piores para os mais pobres. Nesse contexto, a adoção de medidas de distanciamento social, para o enfrentamento da emergência em saúde pública, prejudica sobretudo os trabalhadores informais, colocando-os frente ao seguinte paradoxo: trabalhar e se expor ao vírus, ou permanecer em casa e sucumbir à fome. Tal questão econômica, contudo, precisa ser analisada sob a ótica da proteção da vida e da saúde, a partir de critérios científicos, técnicos e éticos, acima das diferentes ideologias políticas, a exigir a atuação eficiente dos Estados e da comunidade internacional para a melhor proteção dos direitos humanos.


2.Colisão de direitos humanos e a pandemia da Covid-19

Os direitos humanos, frequentemente, colidem entre si, o que gera desafios hermenêuticos quanto à sobreposição de um direito em detrimento de outro. Com isso, o postulado da proporcionalidade e a teoria dos limites dos limites surge como técnicas de harmonização desses direitos.

O postulado da proporcionalidade pode ser compreendido como instrumento de controle contra abusos cometidos pelo poder público (proibição de excesso), bem como mecanismo contra a omissão ou ação insuficiente do Estado (proibição de insuficiência)1. Importa considerar cada um dos três elementos do postulado da proporcionalidade: a) a conformidade ou adequação de meios; b) a exigibilidade ou a necessidade; c) a proporcionalidade em sentido estrito2.

Por sua vez, a teoria dos limites dos limites, de origem alemã, busca fixar obstáculos normativos para a ação do poder público quando se procura restringir direitos humanos. As limitações a esses direitos são legitimadas por meio da obediência a um conjunto de condições formais e materiais previamente estabelecidas na Constituição e nos tratados internacionais3. Por isso, as limitações jurídicas devem ocorrer em casos estritamente necessários e indispensáveis à concretização de outros direitos ou interesses almejados, observada as balizas constitucionais4. Nesse sentido, o art. 18º, 2, da Constituição portuguesa afirma que “a lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos”.

A aplicação da teoria dos limites dos limites deve cumprir alguns requisitos, para que o núcleo essencial do direito humano-fundamental em jogo seja salvaguardado. É preciso haver clareza e proporcionalidade na limitação legislativa5. Por exemplo, a teoria dos “limites dos limites” (schranken-schranken) foi aplicada na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 1.055, pelo Supremo Tribunal Federal, para tutelar o ­direito fundamental à propriedade do contribuinte6. O STF considerou inconstitucional a Medida Provisória 427 de 11.2.1994 (LGL\1994\741), reeditada pela Medida Provisória 449 de 17.3.1994 (LGL\1994\734), convertida na Lei 8.866/94 (LGL\1994\41), a qual “dispõe sobre o depositário infiel de valor pertencente à Fazenda Pública e dá outras providências”. O STF concluiu que não se pode coagir, sob pena de prisão, o devedor a depositar o valor referente à dívida na contestação ou, após a sentença, no prazo de 24 horas. Tampouco se pode submeter o devedor a sofrer processo judicial de depósito sem que tenha ocorrido a finalização do processo administrativo fiscal, além de se proibir, em se tratando de coisas fungíveis, seguir-se o disposto sobre o mútuo (art. 1.280 do CC/16 (LGL\1916\1), cuja norma foi repetida no art. 645 do CC/02 (LGL\2002\400)), submetendo o devedor a regime mais gravoso de pagamento, em face dos postulados da proporcionalidade, do limite do direito de propriedade e/ou do devido processo legal.

Os direitos humanos comportam restrições, porque não são absolutos. Em relação aos direitos à liberdade e à propriedade, por exemplo, a Constituição Federal permite a pena de morte em caso de guerra declarada (art. 5º, inciso XLVII, alínea “a”, CF (LGL\1988\3)), bem como a contenção do direito à liberdade do apenado com reclusão, além da desapropriação da propriedade privada mediante justa e prévia indenização7.

Os direitos humanos-fundamentais podem ser compatibilizados, a partir dos critérios contidos no postulado da proporcionalidade (adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito) para a ponderação dos interesses contrapostos.

Canotilho observa que o legislador – entendimento que também se aplica aos membros dos demais Poderes da República – está “vinculado à salvaguarda do núcleo essencial dos direitos, liberdades e garantias que não pode, em caso algum ser violado”8.

Para André de Carvalho Ramos, a teoria dos limites dos limites corresponde à proteção da essência dos direitos humanos, com o objetivo de preservar o núcleo intocável desses direitos da ação do legislador. No direito brasileiro, não há expressa previsão da proteção do conteúdo essencial. Porém, de maneira implícita, isso se dá por meio da imutabilidade das cláusulas pétreas previstas no art. 60, § 4º, CF/88 (LGL\1988\3)9.

Os direitos humanos-fundamentais, muitas vezes, assumem a natureza de princípios jurídicos, cuja colisão não pode ser resolvida de forma abstrata, mas apenas em face de casos concretos. Logo, é indispensável estabelecer uma hierarquia móvel entre os princípios colidentes, a fim de evitar relações abstratas de prevalência absoluta10.

Nesse sentido, o art. 489, § 2º, do CPC (LGL\2015\1656) afirma que, no “caso de colisão entre normas, o juiz deve justificar o objeto e os critérios gerais da ponderação efetuada, enunciando as razões que autorizam a interferência na norma afastada e as premissas fáticas que fundamentam a conclusão.”11

Em se tratando de direitos humanos, as normas materiais estão presentes tanto no plano interno quanto no direito internacional. O Sistema Interamericano de ­Direitos Humanos, composto pela Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) e pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), tem sua jurisdição sobre toda a América. O Brasil, signatário da Convenção Americana de Direitos Humanos, deve se ater não apenas ao diploma americano, mas também aos standards interpretativos resultantes das decisões da Corte IDH.

Em 10 de abril de 2020, a CIDH editou a Resolução 01/2020, para tratar da pandemia da Covid-19 e do seu impacto para os direitos humanos em toda a América. O continente americano é a região mais desigual do planeta, caracterizada por índices elevados de pobreza. A precariedade ao acesso aos serviços básicos (como água e saneamento), as submoradias (com enorme contingente de pessoas vivendo em favelas) e as altas taxas de trabalho informal e de desemprego tornam o combate à Covid-19 ainda mais complexo. Tais fatores são agravados, na América Latina, por heranças provenientes de regimes ditatoriais, como a violência generalizada e o autoritarismo, que realçam a concentração de riquezas e a exploração de grupos minoritários (como os idosos, as pessoas privadas de liberdade, mulheres, povos indígenas, migrantes e refugiados, crianças e adolescentes, pessoas LGBTI, com deficiência e afrodescendentes).

Do mesmo modo, a Corte IDH emitiu, em 09 de abril de 2020, a Declaração 1/20, sobre a Covid-19 e os Direitos Humanos, na qual exorta os Estados Membros da Convenção Americana a enfrentar a pandemia por meio do diálogo e da cooperação internacional e regional conjunta e solidária. Afirma, dentre outros pontos, que todas as medidas que possam restringir o gozo e o exercício dos direitos humanos devem ser limitadas no tempo, estarem em conformidade com critérios científicos, serem razoáveis, estritamente necessárias e proporcionais, bem como consistentes com os demais requisitos desenvolvidos na legislação interamericana de direitos humanos. Somado a isso, a Corte IDH ressalta que o uso da força para a implementação das medidas de contenção, por parte dos funcionários encarregados do cumprimento da lei, deve estar em conformidade com os princípios da necessidade absoluta, proporcionalidade e precaução, de acordo com a jurisprudência da Corte Interamericana.

A pandemia da Covid-19 gera uma crise sanitária de dimensões globais, mas também alcança à proteção de diversos direitos humanos, uma vez que as medidas de distanciamento social buscam restringir direitos dos indivíduos a fim de conter a propagação do vírus. Ao se pensar no continente americano, as desigualdades se acentuam ao expor a população carente a um patógeno que, impreterivelmente, sobrecarrega os sistemas de saúde local e, por isso, exige a adoção de medidas de contenção, cujos efeitos econômicos atingem, de forma mais nociva, a vida da população economicamente mais vulnerável.


3.Distanciamento social como forma de contenção do novo coronavírus

Estima-se que 1/3 da população do mundo tenha permanecido em distanciamento social12. Na América Latina, cerca de 50% dos trabalhadores são informais, ou seja, não possuem vínculo empregatício, não tendo acesso aos benefícios e as proteções sociais. Metade da população desses países depende, pois, apenas de seus esforços laborativos para sobreviver.

Essa vulnerabilidade econômica não é, todavia, diferente em outros países em desenvolvimento. Na Índia, por exemplo, estima-se que 65% a 70% da população emprega-se no setor informal. Trezentos milhões de indianos ficaram sem rendimentos por conta da quarentena declarada a partir de 23 de março13.

Diante da repentina crise sanitária, não há solução rápida nem, tampouco, simples, já que ainda não existe vacina para prevenir a doença nem medicamentos específicos para o seu tratamento, o que exige a adoção de medidas de distanciamento social para diminuir o contágio e o número de óbitos. A insuficiência de leitos em hospitais, a carência de equipamentos de proteção individual (EPI´s), de respiradores, bem como da suficiência de testes confiáveis para a confirmação da doença fizeram com que medidas sanitárias drásticas, como o fechamento do comércio, a paralisação das escolas e o fechamento das fronteiras, precisassem ser adotadas.

O distanciamento social segue recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS), conforme informações, critérios científicos e políticas de contenção adaptadas para cada país. Por exemplo, Coreia do Sul e Japão praticaram isolamento social juntamente com a adoção de medidas preventivas, como a massiva aplicação de testes, o rastreamento das pessoas infectadas e o uso da tecnologia para diminuir as taxas de contágio. O sucesso ao combate da Covid-19 nesses países se dá por diversos fatores.

A Coreia do Sul, cuja população é de 51,64 milhões de habitantes, até 23 de maio de 2020, contabilizou 11.165 casos e somente 266 mortes14. Para isso, adotou testes em massa: 600 lugares em todo o país, incluindo o sistema de drive thru, foram usados para testar até 20 mil pessoas por dia; os resultados levavam, em média, seis horas para serem revelados. Se o caso fosse confirmado, as autoridades de saúde investigavam com quem a pessoa teve contato, com auxílio de imagens de câmeras de segurança, dados de smartphones e registros de cartões de crédito15. Tais informações foram disponibilizadas em aplicativos de rastreamento por GPS, usados tanto para supervisionar e monitorar os pacientes em tempo real, quanto para evitar que alguém se aproximasse da pessoa contaminada16 e penalizar aqueles que quebrassem a quarentena.

O distanciamento social sul-coreano também considerou o grau de risco dos pacientes: os idosos e os gravemente doentes foram hospitalizados; os de baixo risco, como os jovens e os com sintomas leves, acabaram sendo enviados para dormitórios, alguns emprestados pelas empresas Samsung e LG. Além disso, devido ao aprendizado acumulado com o enfrentamento ao surto da Síndrome Respiratória do Oriente Médio (MERS), em 2015, e a confiança nas informações geridas pelo governo, houve um alto grau de adesão voluntária ao distanciamento social. Ainda, as pessoas vindas do exterior, independentemente de apresentarem sintomas da Covid-19, foram colocadas em quarentena obrigatória por duas semanas.

O Japão, por sua vez, apesar da proximidade com a China e da alta densidade populacional de pessoas idosas, também se tornou um modelo eficiente de contenção do novo coronavírus. Até 23 de maio de 2020, o país que tem 126,5 milhões de habitantes, tinha 16.543 casos confirmados e somente 814 óbitos17. Esses números decorrem de uma política de combate à pandemia, baseada na testagem dos focos proeminentes da doença.

Por exemplo, na ilha de Hokkaido, no norte do Japão, o vírus foi identificado em uma escola primária, o que permitiu que o governo fechasse todas as escolas da região e decretasse estado de emergência; três semanas depois, o vírus parou de se espalhar.

Questões culturais locais dificultaram a disseminação da Covid-19, porque os japoneses possuem outros modos de comportamento, como o de cumprimentar uns aos outros – curvando-se aos demais, e não dando beijos no rosto e apertos de mão –, além da maneira disciplinada com que tratam as questões de higiene, com o uso de máscaras como meio de prevenir o contágio e a disseminação da doença18. Assim, o Japão mostra como é importante pensar no coletivo durante uma pandemia e ser solidário para reduzir as taxas de contaminação.

Por outro lado, o modelo adotado pela Suécia foi apontado, pelo Presidente Jair Bolsonaro, como exemplo de sucesso para o Brasil19. O país escandinavo não implementou leis específicas para isolamento social durante os meses de março e abril de 2020. Limitou-se a uma política pública de informação, prevenção, cuidado e segurança coletivas. Adotou uma forma de isolamento social diferente, baseada na confiança, no respeito e na cidadania, sem a imposição de multas ou regulamentações mais severas20. Porém, até 23 de maio de 2020, foram registrados 33.188 casos e 3.992 mortes na Suécia, cuja população é de pouco mais de 10 milhões de habitantes21.

Não obstante o modelo sueco ter sido considerado bem sucedido pelo Presidente da República no Brasil, quando esses números são contextualizados com outros países da região, percebe-se que aqueles que adotaram medidas de distanciamento social tiveram menos casos confirmados e mortes por Covid-19 que a Suécia. A Noruega, país vizinho, com população de 5,368 milhões de habitantes, até 23 de maio de 2020, registrou 8.332 casos, com apenas 235 óbitos. Já a Finlândia, de 5,518 milhões de habitantes, teve, no mesmo período, 6.568 casos e somente 306 mortes.

Há quatro graus de restrições sociais que podem ser adotados. O grau 1 limita-se a proteger as pessoas do chamado “grupo de risco”’ por meio do contato com indivíduos imunes e/ou resistentes à doença. Esse é o modelo do isolamento vertical que, ao invés de fazer com que todas as pessoas fiquem em casa e que se fechem escolas e empresas, restringe o convívio apenas das pessoas que compõem o grupo de maior risco (como idosos, portadores de diabetes, hipertensão e doenças cardíacas ou pulmonares). Com isso, os demais indivíduos, mesmo que contaminados, não teriam maiores prejuízos já que a doença não traria consequências à sua saúde nem, tampouco, risco elevado de morte. O isolamento vertical foi adotado, inicialmente, pelo Reino Unido e pela Holanda. Porém, foi criticado por ter contribuído para a elevação das taxas de contágio, aumento de casos confirmados da doença e de mortes. Afinal, as pessoas que não estão nos grupos de risco – quando assintomáticas, ou por falta ou atraso de testes que confirmem a Covid-19 – acabam levando o vírus para dentro de casa e contagiando aqueles que estariam no grupo de risco. Ademais, muitas pessoas, principalmente em países em desenvolvimento, não sabem que têm diabetes, hipertensão e doenças pulmonares, o que dificulta a eficácia do isolamento social vertical.

O grau 2 abrange recomendações de fechamento de escolas e estabelecimentos não essenciais.

O grau 3 é ainda mais restritivo aos direitos à liberdade de locomoção, porque comporta o toque de recolher noturno, vedando a livre circulação de pessoas durante à noite.

E, finalmente, o grau 4, também conhecido como lockdown, proíbe a circulação de pessoas. É a medida mais extrema do isolamento social, com o fechamento de fronteiras, estabelecimentos comerciais não essenciais e cancelamento de eventos22.

O trabalho desde casa e o autoisolamento é mais complicado para os trabalhadores informais, que se dividem entre “ganhar o pão diário ou ficar em casa e passar fome”23, a não ser que tais medidas sejam compensadas financeiramente pelo Estado. Afinal, para esses trabalhadores, os prejuízos econômicos e a necessidade de sobrevivência são mais evidentes e os coloca diante do paradoxo entre morrer da Covid-19 ou padecer de fome.

Diante da crise sanitária e da necessidade de distanciamento social, é imprescindível a intervenção do Estado na concessão de benefícios assistenciais. Por exemplo, nos meses de março e abril de 2020, 37 milhões de norte-americanos solicitaram o seguro desemprego, principal instrumento assistencial para quem fica sem trabalho, de um total de 156,6 milhões de pessoas empregadas24. No mesmo período, no Brasil apenas 1,5 milhão de trabalhadores receberam o seguro desemprego (o país tinha, em março de 2020, 33,6 milhões de trabalhadores com carteira assinada). Entretanto, no final de abril, 57 milhões de brasileiros estavam percebendo auxílio emergencial para trabalhadores informais ou tiveram contrato de trabalho suspenso ou jornada e salários reduzidos, conforme o programa emergencial do emprego e da renda previsto na Medida Provisória 936/2020 (LGL\2020\3688), convertida na Lei nº 14.020, de 2020 (LGL\2020\8782). Até 11 de maio, 4 milhões de trabalhadores estavam com contrato suspenso e 3,2 milhões com jornada de trabalho reduzido no Brasil. No entanto, a estimativa do governo brasileiro é de que esse número poderia chegar a 24,5 milhões nos próximos meses (cerca de 70% dos trabalhadores informais).

A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) contínua do IBGE, em março de 2020, mostrou uma perda de 2,3 milhões de postos de trabalho em relação ao trimestre anterior, sendo que desse total 1,6 milhão são trabalhadores por conta própria ou sem carteira. No final de abril, 59 milhões de brasileiros que pediram seguro desemprego tiveram contrato suspenso ou jornada reduzida temporariamente ou foram aprovados para receber o auxílio emergencial para informais.

A pandemia da Covid-19 apresenta uma realidade dicotômica: ao mesmo tempo que pugna por cooperação internacional (em especial, na busca de tratamentos e na descoberta de uma vacina que possa beneficiar todos os países), fortalece decisões de isolamento entre os povos, inclusive com o fechamento das fronteiras. Os desdobramentos do vírus em cada país dependem das políticas e das ações tomadas por seus governantes. Contudo, o reforço ao nacionalismo e a postura negacionista da pandemia, com a responsabilização da Organização Mundial de Saúde (OMS) pela crise econômica, representa uma ameaça ao diálogo e fragiliza os esforços da comunidade internacional no combate aos efeitos do novo coronavírus.

Assim, iniciativas populistas como a do Presidente Donald Trump, de comprar de uma empresa alemã a exclusividade na produção de uma vacina somente para os cidadãos norte-americanos, aprofunda o cenário de violação dos direitos humanos, baseado na ideologia do capitalismo sem ética, fundado na desigualdade radical, na supremacia branca, na violência contra as mulheres ou contra os povos indígenas e na lógica do lucro sem limites. Essa ideologia amplia as assimetrias entre nações pobres e ricas, além de reduzir as possibilidades de países em desenvolvimento de criar condições satisfatórias para defender a saúde e a vida das populações mais vulneráveis25.

Como o vírus não discrimina, não respeita fronteiras, as políticas de saúde devem estar igualmente comprometidas com todas as vidas. Todas as vidas importam e merecem ser protegidas. Não pode o mercado – que também precisa se guiar por valores éticos e ter responsabilidade social, nos termos art. 170, caput, da Constituição Federal26 – nem, muito menos, o Estado, cuja atuação legítima deve se enquadrar nos princípios e fundamentos constitucionais (arts.  e da CF (LGL\1988\3))27 – na esteira do que critica a biopolítica28 e a necropolítica29 – distinguir aqueles que são dignos de merecer atenção e os que podem ficar abandonados à doença e à morte.


4.Enfrentamento da Covid-19 no Brasil e a judicialização da pandemia

No Brasil, o enfrentamento à pandemia da Covid-19 tem sido realizado por uma intensa produção legislativa, acompanhada de seguidas decisões judiciais.

A Lei 13.979/2020 (LGL\2020\1068) foi editada para prever medidas para o enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2020. O seu art. 3º afirma que as autoridades poderão adotar, no âmbito de suas competências, dentre outras medidas: o isolamento; a quarentena; a determinação de realização compulsória de exames médicos, testes laboratoriais, coleta de amostras clínicas, vacinação e outras medidas profiláticas e tratamentos médicos específicos; estudo ou investigação epidemiológica; exumação, necropsia, cremação e manejo de cadáver; restrição excepcional e temporária, conforme recomendação técnica e fundamentada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, por rodovias, portos ou aeroportos de entrada e saída do País e locomoção interestadual e intermunicipal; requisição de bens e serviços de pessoas naturais e jurídicas, com o pagamento posterior de justa indenização; e autorização excepcional e temporária para a importação e distribuição de quaisquer materiais, medicamentos, equipamentos e insumos da área de saúde sujeitos à vigilância sanitária sem registro na Anvisa considerados essenciais para auxiliar no combate à pandemia do coronavírus, desde que registrados por pelo menos 1 (uma) das seguintes autoridades sanitárias estrangeiras e autorizados à distribuição comercial em seus respectivos países: 1. Food and Drug Administration (FDA); 2. European Medicines Agency (EMA); 3. Pharmaceuticals and Medical Devices Agency (PMDA); 4. National Medical Products Administration (NMPA), conforme redação dada pela Lei nº 14.006, de 2020 (LGL\2020\6765).

Entretanto, o efetivo enfrentamento da pandemia no Brasil tem sido prejudicado por crises políticas, marcadas pela tentativa de concentração de poderes no chefe do Poder Executivo da União (hiperpresidencialismo)30, falta de uma política sanitária mais eficiente na redução das taxas de transmissão do vírus, com elevado número de óbitos, e ausência de coordenação e diálogo entre os entes federativos.

Exemplo disso foi a liminar concedida nas Arguições de Descumprimento de Preceitos Fundamentais (ADPF´s) 668 e 669, pelo Min. Luís Roberto Barroso31, contra o ato do Governo Federal, de divulgação preliminar e de contratação de campanha publicitária designada “O Brasil Não Pode Parar”. A decisão considerou que a situação sanitária era gravíssima e não havia dúvida de que a infecção por Covid-19 representa uma ameaça à saúde e à vida da população. Argumentou-se que a experiência dos demais países no combate à Covid-19 demonstrava a necessidade da adoção de medidas para reduzir a velocidade de contágio – a fim de que os sistemas de saúde pudessem melhor suportar o tratamento das pessoas infectadas – dentre as quais estão o fechamento de escolas e do comércio, para evitar aglomerações, reduzir a movimentação de pessoas e possibilitar o distanciamento social. Tais medidas sanitárias decorrem de recomendações da comunidade científica, como a Organização Mundial de Saúde, o Ministério da Saúde, o Conselho Federal de Medicina e a Sociedade Brasileira de Infectologia.

O Min. Luís Roberto Barroso afirmou que o combate à Covid-19 no Brasil – por ser um país em desenvolvimento, com grandes aglomerações urbanas, muitas comunidades pobres e elevado número de pessoas vivendo em situação de precariedade sanitária – faz com que o distanciamento social seja uma medida adequada de gestão do sistema único de saúde e necessária para salvar vidas. Ainda que houvesse dúvida sobre a eficácia da medida sanitária de isolamento social, pela aplicação dos princípios da precaução e da prevenção, a questão deveria ser solucionada em favor do bem da saúde da população.

Dessa forma, nos termos do voto do Min. Luis Roberto Barroso, a campanha

“O Brasil não pode parar” viola o art. 37, § 1º, da Constituição Federal, já que, ao invés de “informar, educar ou orientar socialmente”, incita o inverso da necessidade do distanciamento social, tornando-se uma propaganda desinformativa, que traz grave ameaça para a saúde da população e leva cada cidadão a tomar decisões firmadas em bases inverídicas. Além disso, o uso de recursos públicos para esses fins se afasta do interesse público consistente em salvar vidas, proteger a saúde e preservar a ordem e o funcionamento do sistema de saúde, e não observa os princípios da legalidade, da moralidade e da eficiência (art. 37, caput, CF (LGL\1988\3)).

Ao suspender a ação publicitária, nas ADPF´s 668 e 669, o Min. Luís Roberto Barroso concluiu que

“não há efetivamente uma dicotomia entre proteção à saúde da população e proteção à economia e aos empregos da mesma população (...). O mundo inteiro está passando por medidas restritivas em matéria de saúde e pelos impactos econômicos delas decorrentes. Caso o Brasil não adote medidas de contenção da propagação do vírus, o próprio país poderá ser compreendido como uma ameaça aos que o estão combatendo, passando a correr o risco de isolamento econômico. Não bastasse isso, a supressão das medidas de distanciamento social levará inevitavelmente à propagação do vírus, conforme ampla experiência internacional, e, em algum momento do futuro, a medida de restrição da população será ainda mais grave. Portanto, a demora na tomada de medidas de contenção da propagação do vírus tende a aumentar os riscos também para a economia. Nota-se, portanto, que a economia precisa que a saúde pública seja protegida para que volte a funcionar em situação de normalidade. É igualmente importante ter em conta que não se trata aqui de uma decisão política do Presidente da República acerca de como conduzir o país durante a pandemia. Haveria uma decisão política, no caso em exame, se a autoridade eleita estivesse diante de duas ou mais medidas aptas a produzir o mesmo resultado: o bem estar da população, e optasse legitimamente por uma delas. Não é o caso. A supressão das medidas de distanciamento social, como informa a ciência, não produzirá resultado favorável à proteção da vida e da saúde da população. Não se trata de questão ideológica. Trata-se de questão técnica. E o Supremo Tribunal Federal tem o dever constitucional de tutelar os direitos fundamentais à vida, à saúde e à informação de todos os brasileiros.”

A falta de diálogo e entendimento entre os entes federativos no Brasil também agravou a adoção de políticas sanitárias eficientes para o combate à Covid-19. Tal situação – como já vinha ocorrendo antes da pandemia com a judicialização da saúde32 – transfere de modo crescente ao Poder Judiciário a necessidade de intervenção para a proteção dos direitos fundamentais.

Ao tratar da questão do federalismo (cooperativo) no combate à calamidade, o Supremo Tribunal Federal, na ADPF 672-MC, com base no princípio da autonomia das entidades federativas, e nos arts. 23, incs. II e IX, e 24, inc. XI, 30, inc. II, e 198 da Constituição Federal, bem como no arts. 6º, inc. I, e 7º da Lei 8.080/1990 (LGL\1990\41), asseverou que não compete ao Poder Executivo federal afastar, unilateralmente, as decisões dos governos estaduais, distrital e municipais33. Estes entes federativos, no exercício de suas competências constitucionais, podem adotar, no âmbito de seus respectivos territórios, medidas sanitárias restritivas como a imposição de distanciamento/isolamento social, quarentena, suspensão de atividades de ensino, restrições de comércio, atividades culturais e à circulação de pessoas, entre outros mecanismos reconheci­damente eficazes para a redução do número de infectados e de óbitos, nos termos das recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS) e de estudos técnicos ­científicos34.

Do mesmo modo, o Plenário do STF, em 15 de abril de 2020, ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6.341, conferiu à Medida Provisória 926/2020 (LGL\2020\2716) interpretação conforme à Constituição, e conclui que União, Estados, Distrito Federal e Municípios possuem igual competência para adotar medidas de polícia sanitária, com o objetivo de conter a pandemia do coronavírus, em seus territórios35.

Pelo art. 3º, § 8º, da Lei 13.979/2020 (LGL\2020\1068), as medidas para o enfrentamento da emergência de saúde pública precisam resguardar o exercício e o funcionamento dos serviços públicos e atividades essenciais. O Decreto 10.282, de 20 de março de 2020 (LGL\2020\2717), ao definir no seu art. 3º, §1º, os serviços públicos e atividades essenciais, afirma que são “aqueles indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade, assim considerados aqueles que, se não atendidos, colocam em perigo a sobrevivência, a saúde ou a segurança da população”.

No rol deste artigo, foi acrescentado ao art. 3º, incs. LVI e LVII, do Decreto 10.282/2020 (LGL\2020\2717), pelo Decreto 10.344, de 11 de maio de 2020 (LGL\2020\5933), como atividades essenciais, salões de beleza, barbearias e academias de esporte de todas as modalidades, obedecidas as determinações do Ministério da Saúde. Essa ampliação do rol de atividades consideradas essenciais causou enorme polêmica entre os governadores. No dia 13 de maio, quando o número de mortes pela Covid-19 se aproximava de mil por dia, João Doria e Wilson Witzel, Governadores de São Paulo e Rio de Janeiro, dois dos Estados mais atingidos pela pandemia, a exemplo de outros governadores, se recusaram a cumprir o Decreto Presidencial para evitar a propagação do contágio.

Porém, o país possui 26 estados e mais o Distrito Federal, bem como 5.570 municípios. Alguns desses municípios, até o dia 13 de maio de 2020, não haviam registrado nenhum caso da doença. Logo, nos termos da orientação do STF (v.g., ADI 6.341 e ADPF 672), é preciso respeitar a autonomia de cada ente federativo para que, dentro da sua realidade, possa com critérios técnicos e científicos autorizar, ou não, a liberação da atividade comercial. Sem prejuízo dessa decisão administrativa e/ou legislativa ser controlada pelo Poder Judiciário, quando não seja a que melhor proteja o direito à vida e à saúde da população, conforme uma avaliação das circunstâncias locais, incluindo o número de pessoas doentes, o acesso a unidades de saúde, leitos de UTI´s ou respiradores disponíveis, a adoção de medidas sanitárias de prevenção, dentre outros critérios técnico-científicos.

Nesse sentido, em 18 de maio de 2020, o Min. Dias Toffoli deferiu pedido para suspender, liminarmente, os efeitos da decisão que concedeu a cautelar nos autos do Mandado de Segurança 0004311-66.2020.8.25.0000, em trâmite no Tribunal de Justiça do estado de Sergipe, que havia permitido a abertura de uma barbearia na cidade de Itabaiana, no interior do estado, com fundamento no Decreto Federal 10.344/2020 (LGL\2020\5933). O Presidente do STF argumentou que, embora a Corte tenha reconhecido a competência do presidente da República para dispor sobre atividades essenciais, preservou a atribuição de cada esfera de governo para deliberar sobre a proteção à saúde pública durante a pandemia da Covid-19 (v.g., ADI 6.341 e ADPF 672-MC). Como o estado do Sergipe havia editado um decreto específico para a realidade local, o Decreto Estadual 40.567/2020, proibindo o funcionamento de barbearias, a liminar do TJ/SE foi suspensa pelo STF.

Outra polêmica, envolvendo os entes federativos no enfrentamento da Covid-19, e que causou insegurança jurídica diz respeito à restrição da liberdade de locomoção. A título de exemplo, em 17 de abril de 2020, o Ministro Dias Toffoli negou seguimento à suspensão de liminar 1.315 do Paraná. A análise do mérito versava sobre a imposição de toque de recolher, entre 21 horas e 5 horas do dia seguinte, no município de Umuarama/PR – medida imposta via decreto Municipal 082/2020 –, como forma de prevenir o contágio pela Covid-19.

Como já foi asseverado, a Lei 13.979/2020 (LGL\2020\1068), que trata sobre as medidas de enfrentamento ao coronavírus, traz, no seu artigo 3º, inciso VI, alínea “b”, a possibilidade da restrição à liberdade de locomoção interestadual e intermunicipal, “excepcional e temporária, conforme recomendação técnica e fundamentada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), por rodovias, portos ou aeroportos”. Apesar da competência assegurada ao chefe do poder executivo local em editar normas de interesse municipal na sua região, considerou-se necessário observar recomendações técnicas e fundamentadas pela ANVISA a fim de restringir a liberdade de locomoção dos cidadãos. Por isso, o Min. Dias Toffoli concluiu que o Decreto Municipal 082/2020 de Umuarama/PR tinha mais possibilidade em causar riscos de dano à ordem público-administrativa do que preveni-los, uma vez que

“todos os esforços encetados pelos órgãos públicos devem ocorrer de forma coordenada, capitaneados pelo Ministério da Saúde, órgão federal máximo a cuidar do tema, sendo certo que decisões isoladas, como essa ora em análise, que atendem apenas a uma parcela da população, e de uma única localidade, parecem mais dotadas do potencial de ocasionar desorganização na administração pública como um todo, atuando até mesmo de forma contrária à pretendida.”36

No entanto, o Plenário do STF, em 6 de maio de 2020, ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6.343, suspendeu parcialmente, sem redução de texto, o disposto no art. 3º, VI, b, e §§ 6º e 7º, II, da Lei 13.979/2020 (LGL\2020\1068) para excluir estados e municípios da necessidade de autorização ou observância ao ente federal. Além disso, conferiu interpretação conforme aos referidos dispositivos no sentido de que as medidas neles previstas devem ser precedidas de recomendação técnica e fundamentada, resguardada a locomoção dos produtos e serviços essenciais definidos por decreto da respectiva autoridade federativa, desde que respeitadas as definições no âmbito da competência constitucional de cada ente federativo. Portanto, o STF autorizou que estados e municípios, no âmbito de suas competências e em seu território, pudessem adotar medidas de restrição à locomoção intermunicipal e local durante o estado de emergência, sem a necessidade de autorização do Ministério da Saúde para a decretação de isolamento, quarentena e outras providências.

Tais exemplos se somam a tantos outros casos em que, pela ausência de diálogo e cooperação entre os entes federativos, acabam tendo de ser resolvidos pelo Poder Judiciário. Até 3 de julho de 2020, o painel de Ações Covid-19 do STF mostrava que o Tribunal já tinha recebido 3.608 processos, e proferido 3.793 decisões37.

O Judiciário exerce um papel fundamental para a preservação da democracia e da ordem jurídica. O princípio da separação dos poderes é um mecanismo essencial para impedir o poder absoluto (art. , CF (LGL\1988\3)) e a proteção dos direitos humanos-fundamentais38.

Como a Constituição não restringe o acesso à justiça (art. 5º, inc. XXXV, CF (LGL\1988\3)) e como, pelo denso conteúdo material da Constituição brasileira (com a previsão de valores, princípios, diretrizes, standards etc.), dificilmente um problema jurídico não encontra resposta na ordem constitucional, compete aos juízes exercerem o controle jurídico da legitimidade do poder político. Aliás, desde Marbury vs. Madison (1803), entendimento incorporado no Brasil pela Constituição Republicana (LGL\1988\3) de 1891 (art. 59, § 1º, “a” e “b”), todo desvio jurídico-constitucional pode ser invalidado pelo Poder Judiciário.

Afinal, ao administrador público, no exercício de suas atribuições, está assegurado o juízo de conveniência e de oportunidade, no qual pode, dentre as hipóteses legais e moralmente admissíveis, escolher as que considerar melhores para a concretização do interesse público no âmbito da saúde, da assistência e da ordem econômica. O caráter discricionário dos atos administrativos e as eventuais omissões dos agentes públicos, todavia, não impedem o controle jurisdicional (art. 5º, inc. XXXV, CF (LGL\1988\3))39.

O Poder Judiciário não pode substituir o juízo de conveniência e de oportunidade da competência do agente público, mas possui o dever de fiscalizar se os atos discricionários estão de acordo com a Constituição, levam em consideração a realidade dos fatos e se a decisão administrativa possui coerência lógica para a melhor solução das situações concretas40. A emissão de atos administrativos, que contrariem os limites razoáveis da discricionariedade, tornam-se arbitrários e podem ser anulados pelo Poder Judiciário41.

A eficácia da Constituição, contudo, não depende apenas da atuação do Poder Judiciário, exige também o exercício pleno e ativo da cidadania, o respeito à liberdade de expressão e o funcionamento das instituições democráticas (como o Congresso Nacional, a imprensa livre, as Polícias Judiciárias, os Tribunais de Contas e o Ministério Público42).


5.A proteção do direito à vida frente aos desafios econômicos da Covid-19

Os direitos humanos são conectados entre si; apresentam características de interdependência, unidade e indivisibilidade. Eles devem ser promovidos e protegidos, em sua integridade, para permitirem uma vida digna aos indivíduos.

Não é possível que o Estado escolha e tutele apenas uma parte desses direitos, nem discrimine quais cidadãos devem ser protegidos, devendo zelar pelas condições mínimas de sobrevivência e pela progressiva tutela da dignidade da pessoa humana de todos os indivíduos, cuidando com maior atenção dos grupos mais vulneráveis.

A interdependência dos direitos humanos contribui para a

“satisfação das necessidades essenciais do indivíduo, o que exige, novamente, a atenção integral a todos os direitos humanos, sem exclusão. O conteúdo de um direito pode se vincular ao conteúdo do outro, demonstrando a interação e a complementaridade entre eles, bem como que certos direitos são desdobramentos de outros.”43

É importante que o Estado cumpra as obrigações assumidas nos tratados de direitos humanos, sob pena de incidir em responsabilidade internacional por violação da matéria. Logo, cabe ao Poder Executivo tomar medidas que possibilitem alcançar o cumprimento das obrigações internacionais. Ao Poder Legislativo compete a regulamentação das leis nacionais em diálogo com os tratados de direitos humanos, de modo a harmonizar as ordens jurídicas interna e internacional. Já o Poder Judiciário tem a incumbência de dar efetividade a esses tratados no âmbito interno, garantindo o seu respeito, tendo em vista eventuais conflitos e violações para conferir a máxima efetividade aos direitos humanos-fundamentais44.

Conforme o Min. Celso de Melo,

“os magistrados e Tribunais, no exercício de sua atividade interpretativa, especialmente no âmbito dos tratados internacionais de direitos humanos, devem observar um princípio hermenêutico básico (tal como aquele proclamado no art. 29 da Convenção Americana de Direitos Humanos45), consistente em atribuir primazia à norma que ser reveste mais favorável à pessoa humana, em ordem a dispensar-lhe a mais ampla proteção jurídica. O Poder Judiciário, nesse processo hermenêutico que prestigia o critério da norma mais favorável (que tanto pode ser aquela prevista no tratado internacional como a que se acha positivada no próprio direito interno do Estado), deverá extrair a máxima eficácia das declarações internacionais e das proclamações constitucionais de direitos, como forma de viabilizar o acesso dos indivíduos e dos grupos sociais, notadamente os mais vulneráveis, a sistemas institucionalizados de proteção aos direitos fundamentais da pessoa humana, sob pena de a liberdade, a tolerância e o respeito à alteridade humana tornarem-se palavras vãs.”46

A paralisação da economia em face da necessidade do distanciamento social não apenas tenta conter uma crise sanitária de proporções internacionais, mas também ressalta a grave desigualdade econômica que caracteriza os países da América Latina. A questão é, pois, saber em que medida os direitos humanos podem ser eficazes para combater essas discrepâncias na qualidade de vida da população, de modo a salvaguardar os interesses dos integrantes dos grupos mais vulneráveis.

É preciso enfrentar as graves desigualdades sociais presentes na América Latina para se alcançar melhores níveis de justiça econômica. Para Samuel Moyn, as estratégias de direitos humanos devem almejar a transformação econômica por meio do intervencionismo econômico global, de reformas tributárias e da edição de novas regras antitruste. O grande objetivo seria a formação de um forte Estado de bem-estar social, que poderia, até mesmo, ser estendido em nível global. O acesso aos direitos sociais aos pobres, a proteção dos direitos em face de políticas de austeridade, a proibição de cortes de impostos para os mais ricos e a vedação de novos encargos tributários para os mais pobres são formas de afirmação dos direitos humanos para tentar promover a igualdade econômica47.

A “economia da distância” tem se apresentado como resposta à crise sanitária da Covid-19, o que reduz os impactos econômicos. Essa nova economia, sem contato, permite que as atividades continuem ocorrendo, sem interação física. Exemplos disso são as aulas on-line, os trabalhos em regime de home office, conferências virtuais (webinars) e as compras de produtos e mantimentos pela internet.

Todavia, mesmo nesse regime sem contato, há vulnerabilidades. Para que o produto oferecido on-line chegue até a casa do consumidor, há uma longa linha de entrega, que vai desde o produtor, passando pelo armazenamento e transporte ao domicílio. Assim, aqueles que se encontram na linha de frente da entrega não têm a opção de aderir ao isolamento social, necessitando trabalhar, mesmo com a ameaça da doença.

Por outro lado, o acesso à “economia da distância” se resume àqueles que têm acesso à internet48. O acesso ao mundo digital está disponível apenas para 51% da população mundial. Ainda assim, dentro desse número, encontram-se desigualdades de diversas ordens, como a baixa qualidade de acesso ofertada e a diferença de preço pelos serviços de internet prestados49. Como 49% da população mundial não tem acesso ao meio de comunicação mais difundido e conhecido do planeta, mesmo a “economia da distância” fica prejudicada pela falta de acesso à internet, o que exige que tais pessoas tenham que sair de casa para realizar tarefas, como compras e trabalho, que poderiam ser feitas por meio virtual.

Mais preocupante é a situação daquelas pessoas que permanecem em casa em razão do desemprego provocado pela Covid-19. No final de abril de 2020, o secretário especial do Ministério da Economia, Salim Mattar, estimou que as taxas de desemprego no Brasil podem aumentar de 50% a 100%50. Trabalhadores informais, freelancers e terceirizados têm sofrido mais duramente as consequências financeiras da pandemia, em função da impossibilidade de ofertar seus trabalhos. Uma vez que dependem unicamente de seu esforço para viver, a quarentena forçada os obriga a adotar medidas criativas para garantir a sua sobrevivência e a de suas famílias. Afinal, a informalidade não garante seguro desemprego nem benefícios que são adquiridos pelos trabalhadores formais51.

Durante o estado de calamidade pública, as relações de trabalho foram flexibilizadas e despesas públicas extraordinárias precisaram ser realizadas para socorrer aos mais pobres.

Nesse sentido, foi editada a Medida Provisória 927/2020 (LGL\2020\2711), que autoriza empregadores a adotarem medidas excepcionais – como o teletrabalho, a antecipação de férias individuais, a concessão de férias coletivas, o aproveitamento e a antecipação de feriados, o banco de horas, a suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho, o direcionamento do trabalhador para qualificação e o deferimento do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS – em razão do estado de calamidade pública decorrente da pandemia do novo coronavírus52.

A referida MP 927/2020 (LGL\2020\2711) foi objeto das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 6.342, 6.344, 6.346, 6.348, 6.349, 6.352, 6.354 e 6.377. O STF concluiu, por maioria, que a referida Medida Provisória não fere direitos fundamentais dos trabalhadores, entre eles a proteção contra a despedida arbitrária ou sem justa causa. Prevaleceu o argumento de que a MP 927/2020 (LGL\2020\2711) não infringe a Constituição Federal já que procurou atender uma situação emergencial e preservar empregos, bem como a fonte do sustento dos trabalhadores que não estavam na economia informal. Com a MP 927/2020 (LGL\2020\2711) se compatibiliza com os valores sociais do trabalho, ao perpetuar o vínculo trabalhista com a livre-iniciativa, apesar da saúde financeira das empresas ter sido abalada pela crise sanitária proveniente da Covid-19.

No entanto, o ponto mais polêmico dessa decisão do STF foi a declaração de constitucionalidade do art.  da MP 927/2020 (LGL\2020\2711), pelo qual, durante o estado de calamidade trazido pela pandemia, o empregado e o empregador podem celebrar acordo individual escrito para garantir a permanência do vínculo empregatício, o qual tem preponderância sobre os demais instrumentos legais e negociais, respeitados os limites estabelecidos na Constituição. A divergência recaiu sobre a desconsideração das leis trabalhistas, mesmo em tempo de situação emergencial de saúde, já que o afastamento desse regime jurídico poderia enfraquecer os direitos do trabalhador.

Além disso, outro exemplo decorrente da necessidade de enfrentamento da crise econômica foi a aprovação da lei de auxílio emergencial aos trabalhadores informais no Brasil, popularmente conhecida como “Lei do Coronavoucher”, em abril de 2020. O auxílio emergencial, no valor de R$ 600,00, foi concedido inicialmente pelo prazo de três meses àqueles que cumprissem os requisitos dispostos no art.  da Lei 13.982/2020 (LGL\2020\3853)53. É uma forma que o Poder Público escolheu para conter, mesmo que de modo gradual, a crise econômica decorrente da pandemia.

Até o final de abril, 20,5 milhões de pessoas que se cadastraram no App da Caixa para receber o auxílio emergencial (“coronavoucher”). Esse grupo se somou a outras 30 milhões de pessoas, selecionadas pelo governo pelo CadÚnico, com renda per capta de até meio salário mínimo (R$ 522,50) ou familiar de no máximo 3.135,00 e que recebem seguro-desemprego ou outro benefício social (exceto o Bolsa Família).

Em março de 2020, Juan Pablo Bohoslavsky, especialista independente da ONU sobre os efeitos da dívida externa nos direitos humanos, já havia solicitado aos países que adotassem um regime de renda básica universal em face da pandemia. O procedimento coloca as finanças a serviço dos direitos humanos, ajudando os menos favorecidos a superar a crise financeira, a fim de que sofram menos os seus impactos.

Os governos devem estruturar suas políticas econômicas em consonância com os princípios orientadores sobre os efeitos das reformas econômicas com a preocupação na proteção dos direitos humanos54. Esses princípios buscam avaliar, sistematicamente, o impacto da crise e fazer com que a formulação das políticas econômicas alcance a população mais vulnerável.

A interpretação conforme os direitos humanos proíbe que as reformas econômicas atinjam negativamente os direitos sociais, políticos, civis, culturais e econômicos. Os Estados devem assegurar o respeito, a proteção e a expansão dos direitos humanos, sob a égide da vedação do retrocesso social, cultural e econômico, sobretudo em tempos de recessão econômica55 e pandemia.

Aliás, o art. 2º, item 1, do Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e o art. 1º do Protocolo de São Salvador impedem o retrocesso na concretização dos direitos humanos, impondo o dever de progressividade que obriga os Estados a adotarem medidas econômicas para assegurar a progressiva prestação dos direitos sociais.

Do mesmo modo, o art. 26 da Convenção Americana de Direitos Humanos afirma que os

“Estados Partes comprometem-se a adotar providências, tanto no âmbito interno como mediante cooperação internacional, especialmente econômica e técnica, a fim de conseguir progressivamente a plena efetividade dos direitos que decorrem das normas econômicas, sociais e sobre educação, ciência e cultura, constantes da Carta da Organização dos Estados Americanos, reformada pelo Protocolo de Buenos Aires, na medida dos recursos disponíveis, por via legislativa ou por outros meios apropriados.”

Portanto, os Estados signatários desses tratados internacionais não podem utilizar a justificativa da crise econômica e financeira para reduzir os espaços políticos e fiscais que protegem os direitos humanos.

Nesse sentido, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, na Resolução 01/2020, trouxe a necessidade de os Estados membros adotarem estratégias para o combate do Covid-19, como a formulação de planos de recuperação social e econômica. Tais medidas devem guardar consonância aos standards interpretativos interamericanos e internacionais em razão do caráter universal, indivisível e transversais dos direitos humanos56.

No Brasil, foi aprovada a Emenda Constitucional 106, de 7 de maio de 2020 (LGL\2020\5798), que institui regime extraordinário fiscal, financeiro e de contratações para o enfrentamento da calamidade pública nacional decorrente da pandemia. Essa Emenda permite que a União adote regime extraordinário fiscal, financeiro e de contratações para atender às necessidades dele decorrentes, somente naquilo em que a urgência for incompatível com o regime regular. Com isso, foi permitido que Poder Executivo federal realizasse processos simplificados de contratação de pessoal, em caráter temporário e emergencial, e de obras, serviços e compras que assegurem, quando possível, competição e igualdade de condições a todos os concorrentes, dispensada a observância do art. 169, § 1º, da Constituição Federal (exigência de prévia dotação orçamentária e autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias) para os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público (art. 37, inc. IX, da CF (LGL\1988\3)), limitada a dispensa às situações de que trata o referido inciso, sem prejuízo da tutela dos órgãos de controle. Ainda, autorizou proposições legislativas e atos do Poder Executivo, voltados ao propósito exclusivo de enfrentar a calamidade e suas consequências sociais e econômicas, com dispensa das limitações legais quanto a criação, a expansão ou o aperfeiçoamento de ação governamental que acarretem aumento de despesa e a concessão ou a ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita. Também dispensou, durante o exercício financeiro em que vigore a calamidade pública nacional, a aplicação do art. 167, inc. III, da Constituição Federal que impede operações de créditos que excedam o montante das despesas de capital, ressalvadas as autorizadas mediante créditos suplementares ou especial com finalidade precisa, aprovados por maioria absoluta do Poder Legislativo.

Antes da promulgação da EC 106/2020 (LGL\2020\5798), em 29 de março de 2020, o Ministro Alexandre de Moraes já havia deferido medida cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6.357, para afastar as exigências da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar 101/2000 (LGL\2000\211)) e da Lei de Diretrizes Orçamentárias (Lei 13.898/2019 (LGL\2019\10383)) relativas à demonstração de adequação e compensação orçamentária para a criação e expansão de programas públicos destinados ao enfrentamento da Covid-19, decisão válida a todos os entes federativos que decretaram estado de calamidade pública durante a pandemia. Tal decisão foi ratificada pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, em 13 de maio de 2020, que, por ocasião da superveniência da EC 106/2020 (LGL\2020\5798), extinguiu o processo sem julgamento de mérito57.

Portanto, tanto o Congresso Nacional quanto o Supremo Tribunal Federal autorizaram a ampliação da dívida pública para a realização das despesas necessárias para o enfrentamento do estado de emergência de saúde pública decorrente da pandemia da Covid-19. O afastamento das restrições legais legitimou, no plano constitucional, a aprovação do auxílio emergencial de R$ 600 para pessoas em estado de vulnerabilidade, pelo Congresso Nacional, bem como de auxílios semelhantes concedidos por legislativos municipais para trabalhadores de setores da economia local mais afetados pela redução das atividades. O regime orçamentário e financeiro excepcional, contudo, não significa que o gasto público deva ser realizado sem transparência ou controle.

No Brasil, país tão marcado pelo patrimonialismo e pela corrupção sistêmica, é imprescindível que a sociedade tenha acesso informações e os órgãos de controle das despesas públicas funcionem com autonomia e independência.

Em sentido contrário, a Medida Provisória 928/2020 (LGL\2020\2884) incluiu o art. 6º-B na Lei 13.979/2020 (LGL\2020\1068) para, nos termos do § 1º, suspender

“os prazos de respostas a pedidos de acesso à informação nos órgãos ou nas entidades da administração pública, cujos servidores estejam sujeitos a regime de quarentena, teletrabalho ou equivalentes e que, necessariamente, dependam de: I – acesso presencial de agentes públicos encarregados da resposta; ou II – agente público ou setor prioritariamente envolvido com as medidas de enfrentamento da situação de emergência de que trata esta Lei.”

Essa MP 928/2020 (LGL\2020\2884) também determinou que os pedidos de acesso à informação pendentes de respostas tivessem que ser reiterados no prazo de dez dias, após encerrado o prazo de reconhecimento da calamidade pública (§ 2º), que contra o pedido de informações não caberia recurso (§ 3º) e, ainda, que o pedido de acesso às informações do art. 10 da Lei 12.527/2011 (LGL\2011\4603) poderia ser feito exclusivamente pela internet, vedado o atendimento presencial (§§ 4º e 5º).

Porém, o Plenário do STF, ao julgar as Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI´s) 6.351, 6.347 e 6.353, considerou as restrições impostas pela MP 928/2020 (LGL\2020\2884) à Lei 12.527/2011 (LGL\2011\4603) genéricas, abusivas e, portanto, ofensivas aos princípios da publicidade e da transparência, violando os arts. 37, caput, e 5º, incisos XXXIII e LXXII, da Constituição Federal, o que transformaria o sigilo de informações em regra, não em exceção. A proteção desses preceitos constitucionais é ainda mais importante, durante o estado de legalidade extraordinária (decorrente da calamidade pública nacional)58, em que gestores públicos estão autorizados a dispensar licitações e antecipar pagamentos para a aquisição de insumos e serviços indispensáveis para proteger a saúde das pessoas e salvar vidas (como os arts.  da Emenda Constitucional 106/2020 (LGL\2020\5798) e 4º da Lei 13.979/2020 (LGL\2020\1068), bem como a Medida Provisória 961/2020 (LGL\2020\5733), que autoriza pagamentos antecipados nas licitações e nos contratos, dimensiona os limites de dispensa de licitação e amplia o uso do Regime Diferenciado de Contratações Públicas – RDC durante o estado de calamidade pública)59.

Nesse sentido, também foi objeto de críticas a Medida Provisória 966/2020 (LGL\2020\6048), publicada no Diário Oficial da União de 14 de maio de 2020, que versa sobre a responsabilização de agentes públicos por ação e omissão em atos relacionados com a pandemia da Covid-19. Por tal ato normativo, os agentes públicos somente podem ser responsabilizados nas esferas civil e administrativa se agirem com dolo ou erro grosseiro. Considera erro grosseiro o “erro manifesto, evidente e inescusável praticado com culpa grave, caracterizado por ação ou omissão com elevado grau de negligência, imprudência ou imperícia” (art. 2º). Para a aferição da ocorrência do erro grosseiros, devem ser considerados (art. 3º):

“I – os obstáculos e as dificuldades reais do agente público; II – a complexidade da matéria e das atribuições exercidas pelo agente público; III – a circunstância de incompletude de informações na situação de urgência ou emergência; IV – as circunstâncias práticas que houverem imposto, limitado ou condicionado a ação ou a omissão do agente público; e V – o contexto de incerteza acerca das medidas mais adequadas para enfrentamento da pandemia da Covid-19 e das suas consequências, inclusive as econômicas.”

A matéria não é nova no ordenamento jurídico brasileiro, pois o art. 28 da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro (LGL\1942\3) (LINB – Decreto-lei 4.657/1942 (LGL\1942\3)) prevê que, com a redação da Lei 13.655/2018 (LGL\2018\3430), o “agente público responderá pessoalmente por suas decisões ou opiniões técnicas em caso de dolo ou erro grosseiro”.

O Plenário do STF, em 21 de maio de 2020, conferiu à MP 966/2020 (LGL\2020\6048) interpretação conforme à Constituição para reduzir o seu alcance. Com a finalidade de evitar que a MP 966/2020 (LGL\2020\6048) fosse usada como uma excludente de ilicitude. Consequentemente, afastou a possibilidade dela ser aplicada aos atos de improbidade administrativa, porque o art. 37, § 4º, da CF (LGL\1988\3) já prevê punição mais severa, cuja disciplina está prevista em lei específica (Lei 8.429/1992 (LGL\1992\19)). O STF também trouxe outras balizas para precisar o conceito de erro grosseiro, pois, nos termos do voto do Min. Luis Roberto Barroso,

“autoridade a quem compete decidir deve exigir que as opiniões técnicas em que baseará sua decisão tratem expressamente de normas e critérios científicos e técnicos aplicáveis à matéria, tal como estabelecidos por organizações e entidades, internacional e nacionalmente reconhecidas.”

Embora a referida medida provisória tenha efeitos temporários, isto é, enquanto durar os efeitos do estado de calamidade pública até 31 de dezembro de 2020, nas palavras do Min. Gilmar Mendes, a “Constituição Federal não autoriza ao presidente da República a política genocida na gestão da saúde”.


6.Conclusão

Conforme o relatório da Organização das Nações Unidas (ONU), Shared Responsability, Global Solidarity: Responding to the social-economic impacts of Covid-19, de março de 2020, a pandemia afeta inúmeras frentes, dentre elas, o combate à pobreza e à fome, a dificuldade de acesso à saúde, a deficiência no acesso à educação remota, o aumento do nível de violência de gênero, o acesso inadequado à água potável e às técnicas de higienização, o desemprego, as condições sanitárias impróprias60 e o aumento de conflitos em áreas de risco. Todas as questões citadas impedem o alcance dos objetivos do milênio e dificultam a redução da desigualdade social61.

A complexa natureza da Covid-19 faz com que os países estejam em diferentes níveis de restrições. No final de abril de 2020, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estabeleceu medidas de abrandamento da quarentena horizontal para países europeus que já atingiram o pico da doença. Tais medidas, todavia, precisam ser tomadas após a evidência de que a Covid-19 está controlada no país, somado ao risco mínimo de contágio de pessoas em grupo de risco, à adoção de meios de prevenção em locais de trabalho, ao distanciamento social, ao cuidado com casos importados de outros locais, a capacidade de o sistema de saúde local identificar, testar e isolar os contatos que o paciente teve, colocando-os em quarentena, além da participação social de toda a comunidade durante o período de transição62.

Entretanto, as medidas de restrição social não surtem nenhum efeito sem a colaboração da população. A solidariedade é um valor fundamental a ser ressaltado pela pandemia, pois, se cada indivíduo não toma as medidas de proteção e não pensa no coletivo63, a taxa de contaminação aumenta e atinge a população como um todo, porque o sistema de saúde não dispõe de condições para o atendimento de todos os pacientes.

Para o presidente da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, Joel Hernández Garcia, as medidas de contenção adotadas pelos países devem ser proporcionais, necessárias, temporárias e plenamente justificadas. Cada continente ou país tem suas particularidades, e discrepâncias entre si. As medidas sanitárias não podem ser tomadas de maneira uniforme e igual para todos. Porém, os Estados que utilizam a repressão como modo de enrijecer as políticas de contenção não podem fazê-lo a seu livre arbítrio, devendo observar protocolos internacionais, colocando a saúde e a segurança das pessoas em primeiro lugar64.

A enorme discrepância econômica nos diferentes continentes ao redor do globo exige a adoção de medidas econômicas compensatórias em relação à população mais vulnerável. A crise sanitária atinge a todos em maior ou menor grau. Porém, os trabalhadores informais, por exemplo, são diretamente alcançados pelos efeitos de contenção oriundos da pandemia, uma vez que ficam privados de trabalhar e não possuem renda para sobreviver, sendo indispensável à proteção do Estado para a proteção de sua dignidade. Afinal, há um paradoxo para aqueles que devem escolher entre trabalhar e contrair o vírus, ou permanecer em casa e morrer de fome.

O sistema de saúde, precário em diversas regiões do mundo, acentua as injustiças e atua como um fator biopolítico em razão da falta de testes, equipamentos de proteção individual, leitos, respiradores ou profissionais de saúde que garantam sobrevivência de todos os infectados.

A Covid-19 agrava as desigualdades econômicas e sociais, bem como exige uma nova ética para o capitalismo pós-pandemia. A crise econômica que sucede o vírus traz inseguranças, dúvidas e altos níveis de desemprego.

As vulnerabilidades que já existiam antes da crise sanitária se tornaram mais visíveis, razão pela qual se faz necessário um olhar mais próximo e atento ao desenvolvimento econômico e social dessas pessoas a partir da ótica dos direitos humanos65. Por isso, a cooperação e o diálogo no plano internacional e interno precisam ser intensificados para que as diferentes ideologias e distintas visões políticas possam ser harmonizadas por critérios científicos, técnicos e éticos, indispensáveis para a proteção da vida, da saúde e da recuperação da economia.


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1 .BRASIL. STF, ADPF 645 MC, rel. Min. Gilmar Mendes, j. 13.04.2020, publicado em Processo Eletrônico DJe-091 Divulg 16.04.2020 Public 17.04.2020. 2 .CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional. 6. ed. Coimbra: Almedina Editora, 1993. p. 382-383; MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 223-226; CAMBI, Eduardo. Neoconstitucionalismo e neoprocessualismo. 3. ed. Belo Horizonte: D´Plácido, 2020. p. 565. Pelo art. 8º do Código de Processo Civil, afirma que o juiz, ao aplicar o ordenamento jurídico, deve atender aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardar e promover a dignidade da pessoa humana, além de observar a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência. 3 .DEMARCHI, Clovis. FERNANDES, Fernanda Sell de Souto Goulart. Teoria dos limites dos limites: análise da limitação à restrição dos direitos fundamentais no Direito brasileiro. Revista Brasileira de Direitos e Garantias Fundamentais, Minas Gerais, v. 1, n. 2, p. 73-89, jul.-dez. 2015. p. 11. 4 .FREITAS, Luiz Fernando Calil de. Direitos fundamentais: limites e restrições. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. p. 185. 5 .BRASIL. STF, ADI 223/DF, rel. p/ acórdão Min. Sepúlveda Pertence, p. 49-50, Tribunal Pleno, j. 05.04.1990. 6 .“A garantia institucional da propriedade atua ou funciona como um limite à própria possibilidade de limitação ou conformação do direito de propriedade. Como assinalado pela Corte Constitucional alemã, a garantia institucional assegura um núcleo básico de normas (Grundbestand von Normen) que confere significado ao instituto jurídico denominado “propriedade” (BRASIL. STF, Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 1.055, rel. Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno. j. 15.12.2016). 7 .SILVA, Virgílio Afonso da. Direitos fundamentais: conteúdo essencial, restrições e eficácia. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 186. 8 .CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Constituição dirigente e vinculação do legislador: contributo para a compreensão das normas constitucionais programáticas. 2. ed. Coimbra: Coimbra Ed., 2001. 9 .RAMOS, André de Carvalho. Curso de direitos humanos. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2020. p. 150. 10 .ÁVILA, Humberto. Repensando o “princípio da supremacia do interesse público sobre o particular”. Revista Diálogo Jurídico, n. 7, out. 2001. p. 10; CAMBI, Eduardo. Neoconstitucionalismo e neoprocessualismo, cit., p. 553. 11 .CAMBI, Eduardo; DOTTI, Rogéria; PINHEIRO, Paulo Eduardo d´Arce; MARTINS, Sandro Gilbert; KOZIKOSKI, Sandro Marcelo. Curso de processo civil completo. 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 2019. p. 975-982. 12 .BBC NEWS BRASIL. Coronavírus: 1/3 da população mundial está sob quarentena; veja quatro tipos de restrição. 25 mar. 2020. Disponível em: [www.bbc.com/portuguese/internacional-52040808]. Acesso em: 27.04.2020. 13 .SANTOS, Boaventura de Sousa. A cruel pedagogia do vírus. Almedina: Coimbra, 2020. 14 .A título comparativo, no dia 23 de maio de 2020, o Brasil, cuja população é de 217,4 milhões, já tinha 340.887 casos confirmados e 21.678 mortes por Covid-19. 15 .SETOR SAÚDE. Entenda por que a Coreia do Sul é exemplo mundial no combate ao coronavírus. 3 abr. 2020. Disponível em: [https://setorsaude.com.br/entenda-por-que-a-coreia-do-sul-e-exemplo-mundial-no-combate-ao-coronavirus/. Acesso em: 14.05.2020. 16 .No Brasil, foi editada a Medida Provisória 954/2020 (LGL\2020\4849) que permite o compartilhamento de dados de celulares por empresas telefônicas para o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A referida MP 954/2020 (LGL\2020\4849) salientava que os dados compartilhados teriam caráter sigiloso e seriam usados exclusivamente para a finalidade de compor a produção estatística oficial, não sendo utilizados como objeto de certidão ou meio de prova em processo administrativo, fiscal ou judicial. Porém, a Min. Rosa Weber, relatora das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI’s) 6387, 6388, 6389, 6390 e 6393, deferiu liminares para suspender a eficácia da MP 954/2020 (LGL\2020\4849), por entender que o fornecimento da relação dos nomes, dos números de telefone e dos endereços de dos consumidores, pessoas físicas ou jurídicas, viola os dispositivos da Constituição Federal que asseguram a dignidade da pessoa humana, a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas e o sigilo dos dados. Concluiu que a medida provisória não esclarecia para que tais dados seriam usados, já que não havia expressa relação com a pandemia da Covid-19, e que o próprio IBGE, no dia 4 de maio, anunciou ter iniciado, em parceria com o Ministério da Saúde, à Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad- Covid), para quantificar as pessoas com sintomas da doença e os impactos da pandemia no mercado de trabalho. O IBGE utilizou a base de 211 mil domicílios que participaram da Pnad no primeiro trimestre de 2019, o que, segundo a relatora, evidenciou a desnecessidade e o excesso do compartilhamento de dados disciplinado na MP 954/2020 (LGL\2020\4849), uma vez que o objetivo alegado na norma já está sendo realizado de forma menos intrusiva à privacidade. 17 .A título comparativo, no dia 23 de maio de 2020, o Brasil, cuja população é de 217,4 milhões, já tinha 340.887 casos confirmados e 21.678 mortes por Covid-19. 18 .FRITZ, Martin. Como o Japão mantém o coronavírus sob controle. 24 mar. 2020. Disponível em: [www.dw.com/pt-br/como-o-japão-mantém-o-coronav%C3%Adrus-sob-controle/a-52900385]. Acesso em: 27.04.2020. 19 .MAZUI, Guilherme; KRUGER, Ana. Bolsonaro cita Suécia como exemplo e diz que por ele Brasil adotaria o isolamento vertical. 14 mai. 2020. 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Es probable que en el próximo año seamos testigos de un escenario doloroso en el que algunas criaturas humanas afirmarán su derecho a vivir a expensas de otros, volviendo a inscribir la distinción espuria entre vidas dolorosas e ingratas, es decir, aquellos quienes a toda costa serán protegidos de la muerte y esas vidas que se considera que no vale la pena que sean protegidas de la enfermedad y la muerte” (BUTLER, Judith. El capitalismo tiene sus límites. In: Sopa de Wuhan. Ed. Pablo Amadeo, 2020. p. 62). 26 .Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: I – soberania nacional; II – propriedade privada; III – função social da propriedade; IV – livre concorrência; V – defesa do consumidor; VI – defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação; VII – redução das desigualdades regionais e sociais; VIII – busca do pleno emprego; IX – tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País (grifou-se). 27 .Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I – a soberania; II – a cidadania; III – a dignidade da pessoa humana; IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V – o pluralismo político. Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição. (...). Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I – construir uma sociedade livre, justa e solidária; II – garantir o desenvolvimento nacional; III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. 28 .O estudo do biopoder, de Michel Foucault, busca justificar a eliminação de certos grupos em detrimento da sobrevivência da maior parte da população, sobretudo em razão da motivação do soberano, que detém o poder sobre a vida e a morte de seus cidadãos. Conforme a definição de Michel Foucault, biopoder é “o conjunto dos mecanismos pelos quais aquilo que, na espécie humana, constitui suas características biológicas fundamentais, vai poder entrar numa política, numa estratégia política, numa estratégia geral do poder” (Nascimento da biopolítica: curso dado no Collège de France (1978-1979). São Paulo: Martins Fontes, 2008. p. 3). 29 .Política da morte (ou necropolítica) é um conceito desenvolvido por Achille Mbembe e que serve para salientar o apartheid social que separa e segrega grupos raciais e étnicos minoritários. Cf. MBEMBE, Achille. Necropolítica. São Paulo: N-1 Edições, 2018. Por exemplo, o patamar de mortes da população negra, decorrentes do abuso de autoridade das forças policiais, no Brasil, é muito mais elevado que os mesmos índices relacionados à população branca. A necropolítica foi um dos fundamentos utilizados pelo Min. Rogério Schietti Cruz, do Superior Tribunal de Justiça, em 20 de maio de 2020 – momento em que a pandemia se agravava no Estado de Pernambuco – para negar o habeas corpus coletivo (HC 580.653-PE), em face do ato normativo do governador, consubstanciado no Decreto 49.017, de 11.05.2020, que dispunha sobre a intensificação de medidas restritivas na unidade federativa, de caráter excepcional e temporário, em razão da pandemia da Covid-19. O habeas corpus foi impetrado pela deputada estadual, Erica Clarissa Borba Cordeiro de Moura, em benefício de todos os cidadãos residentes ou em trânsito do Estado de Pernambuco, alegando, em síntese, que “quarentena ou ‘lockdown’ é medida somente aceitável em estado de sítio ou em tempo de guerra, de defesa”; que o decreto seria ilegal, por invasão de competência legislativa da União, bem como que o governador não poderia privar de liberdade os cidadãos, que precisam de “trabalho imediato” para “providenciar o alimento” de suas famílias. Ao negar liminarmente o processamento do habeas corpus, o Ministro Rogério Schietti Cruz asseverou: “A situação vem-se agravando e, provavelmente, dias piores ainda virão em alguns centros urbanos, cujas redes hospitalares não são capazes de atender à demanda crescente por novos leitos e unidades de tratamento intensivo. E boa parte dessa realidade se pode creditar ao comportamento de quem, em um momento como este, deveria deixar de lado suas opiniões pessoais, seus antagonismos políticos, suas questões familiares e suas desavenças ideológicas, em prol da construção de uma unidade nacional. O recado transmitido é, todavia, de confronto, de desprezo à ciência e às instituições e pessoas que se dedicam à pesquisa, de silêncio ou até de pilhéria diante de tragédias diárias. É a reprodução de uma espécie de necropolítica, de uma violência sistêmica, que se associa à já vergonhosa violência física, direta (que nos situa em patamares ignominiosos no cenário mundial) e à violência ideológica, mais silenciosa, porém igualmente perversa, e que se expressa nas manifestações de racismo, de misoginia, de discriminação sexual e intolerâncias a grupos minoritários” (Grifou-se). 30 .O hiperpresidencialismo resulta da concentração de poderes no Chefe do Poder Executivo, fenômeno característico da América Latina, que gera demasiadas responsabilidades e expectativas em uma só pessoa por um período determinado, que, com a queda de sua popularidade, pode trazer crises no sistema político, com enorme risco de regressão dos valores democráticos, ascensão de populismos e violação de direitos humanos. Verificar, dentre outros: GARGARELLA, Roberto. La sala de máquinas de la Constitución. Dos siglos de constitucionalismo en América Latina (1810-2010). Buenos Aires, 2010. p. 271-272. Sob a ótima mais ampla do hiperpresidencialismo, é possível questionar a decisão liminar, na ADPF 663/MC (rel. Min. Alexandre de Moraes, j. 27.03.2020), que autorizou a alteração do procedimento constitucional de apreciação das medidas provisórias, notadamente o disposto no art. 62, § 9º, da CF (LGL\1988\3) (“Caberá à comissão mista de Deputados e Senadores examinar as medidas provisórias e sobre elas emitir parecer, antes de serem apreciadas, em sessão separada, pelo plenário de cada uma das Casas do Congresso Nacional”). Tal decisão do STF, durante a emergência em Saúde Pública de importância nacional e o estado de calamidade pública decorrente do COVID-19, permitiu que as medidas provisórias sejam instruídas perante o Plenário da Câmara dos Deputados e do Senado Federal. Possibilitou, ainda, a emissão de parecer em substituição a Comissão Mista, por parlamentar de cada uma das Casas designado de forma regimental, e deliberação nos plenários da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, operando por sessão remota, na forma e prazo definidos para funcionamento do Sistema de Deliberação Remota (SDR) em cada casa, sem prejuízo das Casas Legislativas regulamentarem a complementação desse procedimento legislativo regimental. 31 .BRASIL. STF, Medida Cautelar na ADPF 669/DF, rel. Min. Luís Roberto Barroso, j. 31.03.2020. Disponível em: [www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/ADPF669cautelar.pdf]. Acesso em: 16.05.2020. 32 .Conforme a pesquisa “Judicialização da Saúde no Brasil: Perfil das demandas, causas e propostas de solução”, divulgada em março de 2019, elaborada pelo Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper) para o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), entre 2008 e 2017, o número de demandas judiciais relativas à saúde registrou um aumento de 130%. Pelo levantamento, os principais assuntos discutidos nos processos em primeira instância são: “Plano de Saúde” (34,05%), “Seguro” (23,77%), “Saúde” (13,23%) e “Tratamento Médico-Hospitalar e/ou Fornecimento de Medicamentos” (8,76%). A incidência elevada de assuntos como “Plano de Saúde” e “Seguro” mostra a relevância das ações judiciais na esfera da saúde suplementar. No âmbito federal, o custo com a judicialização da saúde saltou mais de dez vezes, entre 2010 e 2016, saindo de R$ 122,6 milhões para R$ 1,313 bilhão. Disponível em: [www.cnj.jus.br/demandas-judiciais-relativas-a-saude-crescem-130-em-dez-anos/]. Acesso em: 06.05.2020. 33 .BRASIL. STF, ADPF 672 DF, rel. Min. Alexandre de Moraes, j. 08.04.2020. 34 .Tal orientação também concretiza um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, que é reduzir as desigualdades sociais e regionais (art. 3º, inc. III, CF (LGL\1988\3)). 35 .Disponível em: [www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=441447]. Acesso em: 23.05.2020. 36 .BRASIL. STF, Suspensão de Liminar 1.315 PR, rel. Min. Dias Toffoli. j. 17.04.2020. 37 .O número de decisões é maior que o de processos, em razão da possibilidade de várias decisões serem emitidas em um mesmo processo. 38 .BRASIL. STF, ADPF 672/DF, decisão monocrática do Min. Alexandre de Moraes, j. 08.04.2020. 39 .VIEIRA, Oscar Vilhena. A batalha dos poderes. São Paulo: Companhia das Letras, 2018. 40 .CAMBI, Eduardo; LIMA, Diogo de Araújo; SARTORI, Mariana Novak. Isolamento social e reabertura de atividades não essenciais: controle judicial de atos discricionários em tempos do novo coronavírus (Covid-19). Revista dos tribunais, v. 1018, ago. 2020. Versão on-line. 41 .BRASIL. STF, ADPF 672/DF, decisão monocrática do Min. Alexandre de Moraes, j. 08.04.2020. 42 .A Recomendação Conjunta 02/20 da Presidência-Corregedoria Nacional do Conselho Nacional do Ministério Público, sobre critérios de atuação na fiscalização de políticas públicas, além de contrariar diretrizes do próprio CNMP (como as Recomendações 44 e 48, sobre o controle de gastos mínimos em saúde e educação), fere a Constituição da República e a jurisprudência do STF (a partir da ADPF 45). Isso porque, ao invés de fortalecer o Ministério Público na defesa dos direitos fundamentais sociais, por meio da fiscalização do ciclo das políticas públicas (planejamento-execução-controle), procura amesquinhar a missão constitucional da instituição na proteção da ordem jurídica justa, na promoção da cidadania e no controle da eficiência da Administração Pública (arts. 127, caput, e 129, inc. II e III, CF (LGL\1988\3)). Cf. PINTO, Élida Graziane. Inafastabilidade do controle de políticas públicas pelo MP. Revista Consultor Jurídico, 30 de junho de 2020. Disponível em: [www.conjur.com.br/2020-jun-30/contas-vista-inafastabilidade-controle-politicas-publicas-mp]. Acesso em: 03.07.2020. 43 .RAMOS, André de Carvalho. Op. cit., p. 100. 44 .TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. A proteção internacional dos direitos humanos e o Brasil. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2000. p. 138-139. 45 .Artigo 29 – Normas de interpretação. Nenhuma disposição da presente Convenção pode ser interpretada no sentido de: a) permitir a qualquer dos Estados-partes, grupo ou indivíduo, suprimir o gozo e o exercício dos direitos e liberdades reconhecidos na Convenção ou limitá-los em maior medida do que a nela prevista; b) limitar o gozo e exercício de qualquer direito ou liberdade que possam ser reconhecidos em virtude de leis de qualquer dos Estados-partes ou em virtude de Convenções em que seja parte um dos referidos Estados; c) excluir outros direitos e garantias que são inerentes ao ser humano ou que decorrem da forma democrática representativa de governo; d) excluir ou limitar o efeito que possam produzir a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem e outros atos internacionais da mesma natureza. 46 .BRASIL. STF, Habeas Corpus 91.361, rel. Min. Celso de Mello, j. 23.09.2008, pub. DJe 06.02.2009. 47 .VERSTEEG, Mila. Can Rights combat Economic inequality? 10 abr. 2020. 133 Harvard Law Review, 2017. Disponível em: [https://harvardlawreview.org/2020/04/can-rights-combat-economic-inequality/]. Acesso em: 20.04.2020. 48 .WU, Tim. The New York Times. We need to protect the `Touchless Economy’. 25. mar. 2020. Disponível em: [www.nytimes.com/2020/03/25/opinion/coronavirus-economy-delivery.html]. Acesso em: 21.04.2020. 49 .VALENTE, Jonas. Quase metade do planeta ainda não tem acesso à internet, aponta estudo. Agência Brasil. 28 set. 2019. Disponível em: [https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2019-09/quase-metade-do-planeta-ainda-nao-tem-acesso-internet-aponta-estudo]. Acesso em: 22.04.2020. 50 .Taxa de desemprego no Brasil pode dobrar por covid-19, diz Salim Mattar. 30 abr. 2020. Disponível em: [https://exame.abril.com.br/economia/taxa-de-desemprego-no-brasil-pode-dobrar-por-Covid-19-diz-salim-mattar/]. Acesso em: 14.05.2020. 51 .BERG, Janine. Trabalhadores precários são levados ao limite pelo novo coronavírus. 20 mar. 2020. Disponível em: [https://nacoesunidas.org/artigo-trabalhadores-precarios-sao-levados-ao-limite-pelo-novo-coronavirus/]. Acesso em: 29 abr. 2020. 52 .BRASIL. STF, ADIs 6.342, 6.344, 6.346, 6.348, 6.349, 6.352 e 6.354-DF, rel. Min. Marco Aurélio, rel. p/ o acórdão Min. Alexandre de Moraes. j. 29.04.2020. ADI 6.377, rel. Min. Marco Aurélio. 53 .Art. 2º Durante o período de 3 (três) meses, a contar da publicação desta Lei, será concedido auxílio emergencial no valor de R$ 600,00 (seiscentos reais) mensais ao trabalhador que cumpra cumulativamente os seguintes requisitos: I – seja maior de 18 (dezoito) anos de idade; salvo no caso de mães adolescentes; II – não tenha emprego formal ativo; III – não seja titular de benefício previdenciário ou assistencial ou beneficiário do seguro-desemprego ou de programa de transferência de renda federal, ressalvado, nos termos dos §§ 1º e 2º, o Bolsa Família; IV – cuja renda familiar mensal per capita seja de até 1/2 (meio) salário-mínimo ou a renda familiar mensal total seja de até 3 (três) salários mínimos; V – que, no ano de 2018, não tenha recebido rendimentos tributáveis acima de R$ 28.559,70 (vinte e oito mil, quinhentos e cinquenta e nove reais e setenta centavos); e VI – que exerça atividade na condição de: a) microempreendedor individual (MEI); b) contribuinte individual do Regime Geral de Previdência Social que contribua na forma do caput ou do inciso I do § 2º do art. 21 da Lei 8.212, de 24 de julho de 1991 (LGL\1991\40); ou c) trabalhador informal, seja empregado, autônomo ou desempregado, de qualquer natureza, inclusive o intermitente inativo, inscrito no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico) até 20 de março de 2020, ou que, nos termos de autodeclaração, cumpra o requisito do inciso IV. BRASIL. Lei 13.982/20 (LGL\2020\3853). Altera a Lei 8.742, de 7 de dezembro de 1993 (LGL\1993\71), para dispor sobre parâmetros adicionais de caracterização da situação de vulnerabilidade social para fins de elegibilidade ao benefício de prestação continuada (BPC), e estabelece medidas excepcionais de proteção social a serem adotadas durante o período de enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (Covid-19) responsável pelo surto de 2019, a que se refere a Lei 13.979, de 6 de fevereiro de 2020 (LGL\2020\1068). 54 .ONU. Relator da ONU pede que países adotem a renda básica universal diante da pandemia. 20 mar. 2020. Disponível em: [https://nacoesunidas.org/relator-da-onu-pede-que-paises-adotem-renda-basica-universal-diante-da-pandemia/]. Acesso em: 23 abr. 2020. 55 .ONU. Human Rights Council. Guiding principles on human rights impact assessments of economic reforms. Report of the Independent Expert on the effects of foreign debt and other related international financial obligations of States on the full enjoyment of human rights, particularly economic, social and cultural rights. Disponível em: [https://documents-dds-ny.un.org/doc/UNDOC/GEN/G18/443/52/PDF/G1844352.pdf?OpenElement]. Acesso em: 22.04.2020. 56 .COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Resolución 01/2020. Pandemia y Derechos Humanos en las Americas. Disponível em: [www.oas.org/es/cidh/decisiones/pdf/Resolucion-1-20-es.pdf]. Acesso em: 18.04.2020. 57 .BRASIL, STF, ADI 6.357, rel. Min. Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, j. 13.05.2020. 58 .“A participação política dos cidadãos em uma Democracia representativa somente se fortalece em um ambiente de total visibilidade e possibilidade de exposição crítica das diversas opiniões sobre as políticas públicas adotadas pelos governantes, como lembrado pelo JUSTICE HOLMES ao afirmar, com seu conhecido pragmatismo, a necessidade do exercício da política de desconfiança (politics of distrust) na formação do pensamento individual e na autodeterminação democrática, para o livre exercício dos direitos de sufrágio e oposição; além da necessária fiscalização dos órgãos governamentais, que somente se torna efetivamente possível com a garantia de publicidade e transparência” (BRASIL, STF, ADI 6.351-MC-REF, rel. Min. Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, j. 30.04.2020). 59 .“A legalidade extraordinária é a forma como o Estado Democrático de Direito reage a uma situação emergencial. Mas não há anomia (ausência ou suspensão de leis e direitos), como no estado de exceção. Na legalidade extraordinária, o Estado segue submisso à legislação e deve criar o mínimo possível de novas leis” (STRECK, Lenio Luiz. Operar uma unha não exige anestesia geral! Disponível em: [www.conjur.com.br/2020-mai-11/lenio-streck-operar-unha-nao-exige-anistia-geral. Acesso em: 17.05.2020). 60 .Um quarto das pessoas que vivem em zonas urbanas da América Latina moram em comunidades informais em situação de pobreza, em sua maioria sem posse regular do terreno e sem acesso a serviços básicos. Cerca de 100 milhões de latino-americanos moram em comunidades carentes, também chamadas de favelas, sendo que das 651 comunidades carentes analisadas em 2017, na Argentina, Chile, Colômbia, Guatemala, Paraguai, Nicarágua e Uruguai, quase um quarto delas não contava com acesso regular a água potável, energia elétrica e saneamento básico. Disponível em: [www.saneamentobasico.com.br/servicos-basicos/. Acesso em: 17.05.2020. 61 .ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Shared responsability, global solidarity: Responding to the social-economic impacts of Covid-19. Mar. 2020. Disponível em: [https://unsdg.un.org/sites/default/files/2020-03/SG-Report-Socio-Economic-Impact-of-Covid19.pdf]. Acesso em: 29.04.2020. 62 .WORLD HEALTH ORGANIZATION. WHO/Europe publishes considerations for gradual easing of Covid-19 measures. 24 abr. 2020. Disponível em: [www.euro.who.int/en/health-topics/health-emergencies/coronavirus-Covid-19/news/news/2020/4/whoeurope-publishes-considerations-for-gradual-easing-of-Covid-19-measures]. Acesso em: 04.05.2020. 63 .“Solidariedade é vínculo recíproco em um grupo (wechselseitige Verbundenheit); é a consciência de pertencer ao mesmo fim, à mesma causa, ao mesmo interesse, ao mesmo grupo, apesar da independência de cada um de seus participantes (Zusammengehörigkeitsgefühl). Solidariedade possui também sentido moral, é relação de reciprocidade, é relação de apoio, é adesão a um objetivo, plano ou interesse compartilhado” (MARQUES, Cláudia Lima. Solidariedade na doença e na morte: sobre a necessidade de “ações afirmativas” em contratos de plano de saúde e de planos funerários frente ao consumidor idoso. In: SARLET, Ingo Wolfgang (Org.). Constituição, direitos fundamentais e direito privado. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003. p. 186). 64 .BETIM, Felipe. Presidente da CIDH: ‘‘Coronavirus pode ser desculpa para limitar ainda mais os direitos dos mais vulneráveis‘‘. El País. 19. abr. 2020. Disponível em: [https://brasil.elpais.com/internacional/2020-04-19/presidente-da-cidh-coronavirus-pode-ser-desculpa-para-limitar-ainda-mais-os-direitos-dos-mais-vulneraveis.html?rel=mas]. Acesso em: 25 abr. 2020. 65 .FACHIN, Melina. Direitos humanos em tempos de pandemia. Org. Érika Leahy. Curitiba: Instituto Memória, 2020. p. 3.Haga clic o pulse aquí para escribir texto.


Eduardo Cambi Pós-Doutor pela Università degli Studi di Pavia (Itália). Doutor e Mestre em Direito pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Professor da Universidade Estadual do Norte do Paraná (UENP) e da Universidade Paranaense (UNIPAR). Promotor de Justiça. Coordenador da Escola Superior do Ministério Público do Paraná. Membro da Academia Paranaense de Letras Jurídicas. eascambi@mppr.mp.br Letícia de Andrade Porto Mestranda em Direitos Humanos e Democracia pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Especialista em Ministério Público e Estado Democrático de Direito pela Fundação Escola do Ministério Público do Paraná (FEMPAR). Estagiária de Pós-Graduação do Ministério Público do Paraná (MPPR). leticia.porto21@gmail.com

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