CORONAVÍRUS E IMPACTOS NA REDUÇÃO DA JORNADA DE TRABALHO E DE SALÁRIO E NA SUSPENSÃO CONTRATUAL
- Raul Maia
- 18 de ago. de 2020
- 29 min de leitura
Atualizado: 2 de out. de 2020
Área do Direito: Trabalho
Resumo: Este artigo tem como objetivo estudar as consequências do coronavírus nos contratos de trabalho. Propõe-se examinar a redução da jornada de trabalho e do salário, a suspensão contratual e o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, fazendo-se referência à decisão do Supremo Tribunal Federal a respeito da matéria. Palavras-chave: Coronavírus – Contrato de Trabalho – Jornada de Trabalho – Salário – Suspensão Contratual Abstract: This article aims to study the consequences of coronavirus on employment contracts. It is proposed to examine the reduction of working hours and salary, the contractual suspension and the Emergency Program for Maintaining Employment and Income, referring to the decision of the Supreme Federal Court regarding the matter. Keywords: Coronavirus – Employment Contract – Working Hours – Salary – Contractual Suspension Sumário: 1.Introdução
1.Introdução
O presente estudo tem como objetivo analisar as principais consequências do coronavírus nos contratos de trabalho.
De modo mais específico, propõe-se examinar o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda e as medidas trabalhistas complementares para enfrentamento do estado de calamidade pública e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus.
Nesse sentido, cabe analisar o benefício emergencial de preservação do emprego e da renda, a redução proporcional de jornada de trabalho e de salários e a suspensão temporária do contrato de trabalho, conforme previsão da Medida Provisória 936/2020. No aspecto metodológico, o exame da matéria proposta é realizado, em essência, por meio de pesquisa legislativa, doutrinária e jurisprudencial.
2.Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda
A Medida Provisória 936, de 1º de abril de 2020, com entrada em vigor na data de sua publicação, ocorrida no Diário Oficial da União de 01.04.2020 (art. 20), institui o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda e dispõe sobre medidas trabalhistas complementares para o enfrentamento do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo 6, de 20 de março de 2020, e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (covid-19) de que trata a Lei 13.979, de 6 de fevereiro de 2020 (art. 1º da Medida Provisória 936/2020).
O Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda tem aplicação durante o referido estado de calamidade pública e foi instituído com os seguintes objetivos: “I – preservar o emprego e a renda; II – garantir a continuidade das atividades laborais e empresariais; III – reduzir o impacto social decorrente das consequências do estado de calamidade pública e de emergência de saúde pública” (art. 2º da Medida Provisória 936/2020).
São medidas do Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda: “I – o pagamento de benefício emergencial de preservação do emprego e da renda; II – a redução proporcional de jornada de trabalho e de salários; III – a suspensão temporária do contrato de trabalho” (art. 3º da Medida Provisória 936/2020).
O disposto no art. 3º da Medida Provisória 936/2020 não se aplica, no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, aos órgãos da administração pública direta e indireta, às empresas públicas e sociedades de economia mista, inclusive às suas subsidiárias, e aos organismos internacionais (art. 3º, parágrafo único, da Medida Provisória 936/2020).
Compete ao Ministério da Economia coordenar, executar, monitorar e avaliar o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda e editar normas complementares necessárias à sua execução (art. 4º da Medida Provisória 936/2020).
2.1.Benefício emergencial de preservação do emprego e da renda Foi criado o benefício emergencial de preservação do emprego e da renda, a ser pago nas seguintes hipóteses: “I – redução proporcional de jornada de trabalho e de salário; II – suspensão temporária do contrato de trabalho” (art. 5º da Medida Provisória 936/2020). O benefício emergencial de preservação do emprego e da renda deve ser custeado com recursos da União (art. 5º, § 1º, da Medida Provisória 936/2020). O benefício emergencial de preservação do emprego e da renda será de prestação mensal e devido a partir da data do início da redução da jornada de trabalho e de salário ou da suspensão temporária do contrato de trabalho, observadas as seguintes disposições: I – o empregador deve informar ao Ministério da Economia a redução da jornada de trabalho e de salário ou a suspensão temporária do contrato de trabalho, no prazo de 10 dias, contado da data da celebração do acordo; II – a primeira parcela deve ser paga no prazo de 30 dias, contado da data da celebração do acordo, desde que a celebração do acordo seja informada no prazo a que se refere o inciso I; III – o benefício emergencial deve ser pago exclusivamente enquanto durar a redução proporcional da jornada de trabalho e de salário ou a suspensão temporária do contrato de trabalho (art. 5º, § 2º, da Medida Provisória 936/2020). Caso o empregador não preste a informação dentro do prazo de 10 dias, contado da data da celebração do acordo: I – ficará responsável pelo pagamento da remuneração no valor anterior à redução da jornada de trabalho e de salário ou da suspensão temporária do contrato de trabalho do empregado, inclusive dos respectivos encargos sociais, até a que informação seja prestada; II – a data de início do benefício emergencial de preservação do emprego e da renda será fixada na data em que a informação tenha sido efetivamente prestada e o benefício será devido pelo restante do período pactuado; III – a primeira parcela, observado o disposto no inciso II, será paga no prazo de 30 dias, contado da data em que a informação tenha sido efetivamente prestada (art. 5º, § 3º, da Medida Provisória 936/2020). Ato do Ministério da Economia disciplinará a forma de: “I – transmissão das informações e comunicações pelo empregador; e II – concessão e pagamento do benefício emergencial de preservação do emprego e da renda” (art. 5º, § 4º, da Medida Provisória 936/2020). O recebimento do benefício emergencial de preservação do emprego e da renda não impede a concessão e não altera o valor do seguro-desemprego a que o empregado vier a ter direito, desde que cumpridos os requisitos previstos na Lei 7.998/1990, no momento de eventual dispensa (art. 5º, § 5º, da Medida Provisória 936/2020). O benefício emergencial de preservação do emprego e da renda deve ser operacionalizado e pago pelo Ministério da Economia (art. 5º, § 6º, da Medida Provisória 936/2020). Serão inscritos em dívida ativa da União os créditos constituídos em decorrência de benefício emergencial de preservação do emprego e da renda pago indevidamente ou além do devido, hipótese em que se aplica o disposto na Lei 6.830, de 22 de setembro de 1980, para a execução judicial (art. 5º, § 7º, da Medida Provisória 936/2020). Defende-se o entendimento de que essa inscrição em dívida ativa, em regra, deve ser precedida de regular procedimento administrativo, observando-se o contraditório e a ampla defesa (art. 5º, inciso LV, da Constituição da República). Trata-se, no caso, de título executivo extrajudicial (art. 784, inciso IX, do CPC). Nos termos do art. 6º da Medida Provisória 936/2020, o valor do benefício emergencial de preservação do emprego e da renda deve ter como base de cálculo o valor mensal do seguro-desemprego a que o empregado teria direito, nos termos do art. 5º da Lei 7.998/1990, devendo ser observadas as seguintes disposições: I – na hipótese de redução de jornada de trabalho e de salário, o valor do benefício emergencial de preservação do emprego e da renda deve ser calculado aplicando-se sobre a base de cálculo (valor mensal do seguro-desemprego a que o empregado teria direito) o percentual da redução; Sendo assim, nos casos de redução de jornada de trabalho e de salário, o valor do benefício emergencial de preservação do emprego e da renda deve ser calculado mediante a incidência do percentual da redução sobre o valor mensal do seguro-desemprego. II – na hipótese de suspensão temporária do contrato de trabalho, o valor do benefício emergencial de preservação do emprego e da renda deve ter valor mensal: (a) equivalente a 100% do valor do seguro-desemprego a que o empregado teria direito, na hipótese prevista no caput do art. 8º da Medida Provisória 936/2020 (suspensão temporária do contrato de trabalho pelo prazo máximo de 60 dias, que pode ser fracionado em até dois períodos de trinta dias); ou (b) equivalente a 70% do seguro-desemprego a que o empregado teria direito, na hipótese prevista no § 5º do art. 8º da Medida Provisória 936/2020 (suspensão do contrato de trabalho de empregados de empresa que tiver auferido, no ano-calendário de 2019, receita bruta superior a R$ 4.800.000,00, com o pagamento de ajuda compensatória mensal no valor de 30% do valor do salário do empregado, durante o período da suspensão temporária de trabalho pactuado). Portanto, nos casos de suspensão temporária do contrato de trabalho em empresas com receita bruta anual até R$ 4,8 milhões, o valor do benefício emergencial de preservação do emprego e da renda deve ser pago ao empregado no valor integral (100%) do seguro-desemprego. Nas hipóteses de suspensão temporária do contrato de trabalho em empresas com receita bruta anual superior a R$ 4,8 milhões, o valor do benefício emergencial de preservação do emprego e da renda deve ser pago ao empregado no valor de 70% do seguro-desemprego, pois nessa hipótese o empregador deve pagar ajuda compensatória mensal no valor de 30% do salário do empregado. O art. 5º da Lei 7.998/1990 disciplina o valor do benefício do seguro-desemprego, que deve ser calculado segundo três faixas salariais, observados os critérios ali indicados. Para fins de apuração do benefício do seguro-desemprego, deve ser considerada a média dos salários dos últimos três meses (art. 5º, § 1º, da Lei 7.998/1990). O valor do benefício não pode ser inferior ao valor do salário mínimo (art. 5º, § 2º, da Lei 7.998/1990). Em 2020, para as faixas de salário médio até R$ 1.599,61, para calcular o valor da parcela do seguro-desemprego, multiplica-se o salário médio por 0,8 (80%). Para as faixas de salário médio de R$ 1.599,62 até R$ 2.666,29, para calcular o valor da parcela do seguro-desemprego, o que exceder a R$ 1.599,61 deve ser multiplicado por 0,5 (50%) e somado a R$ 1.279,69. Para as faixas de salário médio acima de R$ 2.666,29, o valor da parcela será de R$ 1.813,03. Como se pode notar, o benefício emergencial de preservação do emprego e da renda, como regra, não irá assegurar integralmente ao empregado o valor do salário anteriormente recebido, acarretando perda de renda aos trabalhadores, o que pode gerar redução no nível de consumo, impacto negativo nas atividades econômicas e, por consequência, acentuação da crise econômica. O benefício emergencial de preservação do emprego e da renda deve ser pago ao empregado independentemente do: I – cumprimento de qualquer período aquisitivo; II – tempo de vínculo empregatício; III – número de salários recebidos (art. 6º, § 1º, da Medida Provisória 936/2020). O benefício emergencial de preservação do emprego e da renda não será devido ao empregado que esteja: “I – ocupando cargo ou emprego público, cargo em comissão de livre nomeação e exoneração ou titular de mandato eletivo; ou II – em gozo: a) de benefício de prestação continuada do Regime Geral de Previdência Social ou dos Regimes Próprios de Previdência Social, ressalvado o disposto no parágrafo único do art. 124 da Lei 8.213/1991, ou seja, exceto pensão por morte ou auxílio-acidente; b) do seguro-desemprego, em qualquer de suas modalidades; c) da bolsa de qualificação profissional de que trata o art. 2º-A da Lei 7.998/1990”1 (art. 6º, § 2º, da Medida Provisória 936/2020). O empregado com mais de um vínculo formal de emprego pode receber cumulativamente um benefício emergencial de preservação do emprego e da renda para cada vínculo com redução proporcional de jornada de trabalho e de salário ou com suspensão temporária do contrato de trabalho, observado o valor previsto no caput do art. 18 da Medida Provisória 936/2020 (R$ 600,00) e a condição prevista no § 3º do art. 18 da Medida Provisória 936/2020 (a existência de mais de um contrato de trabalho intermitente não gera direito à concessão de mais de um benefício emergencial mensal), se houver vínculo na modalidade de contrato intermitente, nos termos do disposto no § 3º do art. 443 da Consolidação das Leis do Trabalho (art. 6º, § 3º, da Medida Provisória 936/2020). Nos casos em que o cálculo do benefício emergencial resultar em valores decimais, o valor a ser pago deve ser arredondado para a unidade inteira imediatamente superior (art. 6º, § 4º, da Medida Provisória 936/2020).
2.2.Redução proporcional de jornada de trabalho e de salário Durante o estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo 6/2020, o empregador pode acordar a redução proporcional da jornada de trabalho e de salário de seus empregados, por até 90 dias, observados os seguintes requisitos: I – preservação do valor do salário-hora de trabalho; II – pactuação por acordo individual escrito entre empregador e empregado, que deve ser encaminhado ao empregado com antecedência de, no mínimo, dois dias corridos; III – redução da jornada de trabalho e de salário, exclusivamente, nos seguintes percentuais: a) 25%; b) 50%; ou c) 70% (art. 7º da Medida Provisória 936/2020). A jornada de trabalho e o salário pago anteriormente devem ser restabelecidos no prazo de dois dias corridos, contado: “I – da cessação do estado de calamidade pública; II – da data estabelecida no acordo individual como termo de encerramento do período e redução pactuado; ou III – da data de comunicação do empregador que informe ao empregado sobre a sua decisão de antecipar o fim do período de redução pactuado” (art. 7º, parágrafo único, da Medida Provisória 936/2020).
2.3.Suspensão temporária do contrato de trabalho Durante o estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo 6/2020, o empregador pode acordar a suspensão temporária do contrato de trabalho de seus empregados, pelo prazo máximo de 60 dias, que pode ser fracionado em até dois períodos de 30 dias (art. 8º da Medida Provisória 936/2020). A suspensão temporária do contrato de trabalho será pactuada por acordo individual escrito entre empregador e empregado, que será encaminhado ao empregado com antecedência de, no mínimo, dois dias corridos (art. 8º, § 1º, da Medida Provisória 936/2020). Durante o período de suspensão temporária do contrato, o empregado: “I – fará jus a todos os benefícios concedidos pelo empregador aos seus empregados; II – ficará autorizado a recolher para o Regime Geral de Previdência Social na qualidade de segurado facultativo” (art. 8º, § 2º, da Medida Provisória 936/2020). É segurado facultativo o maior de 16 anos de idade que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social, mediante contribuição, desde que não esteja exercendo atividade remunerada que o enquadre como segurado obrigatório da previdência social (art. 11 do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto 3.048/1999). Frise-se que o contrato de trabalho deve ser restabelecido no prazo de dois dias corridos, contado: “I – da cessação do estado de calamidade pública; II – da data estabelecida no acordo individual como termo de encerramento do período e suspensão pactuado; ou III – da data de comunicação do empregador que informe ao empregado sobre a sua decisão de antecipar o fim do período de suspensão pactuado” (art. 8º, § 3º, da Medida Provisória 936/2020). Esclareça-se ainda que se durante o período de suspensão temporária do contrato de trabalho o empregado mantiver as atividades de trabalho, ainda que parcialmente, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou trabalho à distância, ficará descaracterizada a suspensão temporária do contrato de trabalho, e o empregador estará sujeito: “I – ao pagamento imediato da remuneração e dos encargos sociais referentes a todo o período; II – às penalidades previstas na legislação em vigor; III – às sanções previstas em convenção ou em acordo coletivo” (art. 8º, § 4º, da Medida Provisória 936/2020). A empresa que tiver auferido, no ano-calendário de 2019, receita bruta superior a R$ 4.800.000,00, somente pode suspender o contrato de trabalho de seus empregados mediante o pagamento de ajuda compensatória mensal no valor de 30% do valor do salário do empregado, durante o período da suspensão temporária de trabalho pactuado, observado o disposto no caput do art. 8º da Medida Provisória 936/2020 (prazo máximo de 60 dias, que pode ser fracionado em até dois períodos de 30 dias) e no art. 9º da Medida Provisória 936/2020, ao prever que o benefício emergencial de preservação do emprego e da renda pode ser acumulado com o pagamento, pelo empregador, de ajuda compensatória mensal, em decorrência da redução de jornada de trabalho e de salário ou da suspensão temporária de contrato de trabalho de que trata a Medida Provisória 936/2020 (art. 8º, § 5º, da Medida Provisória 936/2020).
2.4.Disposições comuns às medidas do Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda O benefício emergencial de preservação do emprego e da renda pode ser acumulado com o pagamento, pelo empregador, de ajuda compensatória mensal, em decorrência da redução de jornada de trabalho e de salário ou da suspensão temporária de contrato de trabalho de que trata a Medida Provisória 936/2020 (art. 9º da Medida Provisória 936/2020). A mencionada ajuda compensatória mensal: I – deverá ter o valor definido no acordo individual pactuado ou em negociação coletiva; II – terá natureza indenizatória; III – não integrará a base de cálculo do imposto sobre a renda retido na fonte ou da declaração de ajuste anual do imposto sobre a renda da pessoa física do empregado; IV – não integrará a base de cálculo da contribuição previdenciária e dos demais tributos incidentes sobre a folha de salários; V – não integrará a base de cálculo do valor devido ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), instituído pela Lei 8.036, de 11 de maio de 1990, e pela Lei Complementar 150, de 1º de junho de 2015; VI – poderá ser excluída do lucro líquido para fins de determinação do imposto sobre a renda da pessoa jurídica e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido das pessoas jurídicas tributadas pelo lucro real (art. 9º, § 1º, da Medida Provisória 936/2020). Logo, a ajuda compensatória mensal, em decorrência da redução de jornada de trabalho e de salário ou da suspensão temporária de contrato de trabalho não tem natureza salarial, nem remuneratória, mas sim de indenização, não havendo incidência de imposto de renda, contribuições previdenciárias, tributos incidentes sobre folha de pagamento e contribuições do FGTS. Como resultado, além de o empregado ser prejudicado com a ausência de depósitos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e com a não integração da na ajuda compensatória mensal no cálculo de outras verbas trabalhistas, não terá o tempo de contribuição computado para fins previdenciários. Além disso, a exclusão da incidência de tributos e de contribuições sociais certamente pode acentuar a diminuição das receitas dos orçamentos públicos e o alegado déficit da Previdência Social. Na hipótese de redução proporcional de jornada e de salário, a referida ajuda compensatória não integra o salário devido pelo empregador e deve observar o disposto no § 1º do art. 9º da Medida Provisória 936/2020, acima indicado (art. 9º, § 2º, da Medida Provisória 936/2020). Fica reconhecida a garantia provisória no emprego ao empregado que receber o benefício emergencial de preservação do emprego e da renda, de que trata o art. 5º da Medida Provisória 936/2020, em decorrência da redução da jornada de trabalho e de salário ou da suspensão temporária do contrato de trabalho de que trata a Medida Provisória 936/2020, nos seguintes termos: “I – durante o período acordado de redução da jornada de trabalho e de salário ou de suspensão temporária do contrato de trabalho; II – após o restabelecimento da jornada de trabalho e de salário ou do encerramento da suspensão temporária do contrato de trabalho, por período equivalente ao acordado para a redução ou a suspensão” (art. 10 da Medida Provisória 936/2020). A dispensa sem justa causa que ocorrer durante o mencionado período de garantia provisória no emprego sujeitará o empregador ao pagamento, além das parcelas rescisórias previstas na legislação em vigor, de indenização no valor de: I – 50% do salário a que o empregado teria direito no período de garantia provisória no emprego, na hipótese de redução de jornada de trabalho e de salário igual ou superior a 25% e inferior a 50%; II – 75% do salário a que o empregado teria direito no período de garantia provisória no emprego, na hipótese de redução de jornada de trabalho e de salário igual ou superior a 50% e inferior a 70%; ou III – 100% do salário a que o empregado teria direito no período de garantia provisória no emprego, nas hipóteses de redução de jornada de trabalho e de salário em percentual superior a 70% ou de suspensão temporária do contrato de trabalho (art. 10, § 1º, da Medida Provisória 936/2020). Essa previsão, de certa forma, esvazia a efetividade da garantia no emprego em questão, pois o correto seria determinar-se a reintegração do empregado, com o pagamento de todas as verbas trabalhistas do período. Se for pactuada cláusula que reduza o salário ou a jornada, a convenção coletiva ou o acordo coletivo de trabalho devem prever a proteção dos empregados contra dispensa imotivada durante o prazo de vigência do instrumento coletivo (art. 611-A, § 3º, da CLT, incluído pela Lei 13.467/2017). O disposto no art. 10 da Medida Provisória 936/2020 não se aplica às hipóteses de dispensa a pedido ou por justa causa do empregado (art. 10, § 2º, da Medida Provisória 936/2020). Na verdade, a mencionada disposição não seria aplicável na demissão a pedido do empregado, na dispensa indireta e na despedida por justa causa. As medidas de redução de jornada de trabalho e de salário ou de suspensão temporária de contrato de trabalho de que trata a Medida Provisória 936/2020 podem ser celebradas por meio de negociação coletiva, observado o disposto no art. 7º (sobre redução proporcional de jornada de trabalho e de salário), no art. 8º (sobre suspensão temporária do contrato de trabalho) e no § 1º do art. 11 da Medida Provisória 936/2020 (art. 11 da Medida Provisória 936/2020). A convenção ou o acordo coletivo de trabalho podem estabelecer percentuais de redução de jornada de trabalho e de salário diversos dos previstos no inciso III do caput do art. 7º da Medida Provisória 936/2020 (que menciona 25%, 50% ou 70%) (art. 11, § 1º, da Medida Provisória 936/2020). Na hipótese de que trata o § 1º do art. 11 da Medida Provisória 936/2020, o benefício emergencial de preservação do emprego e da renda (previsto nos arts. 5º e 6º da Medida Provisória 936/2020) será devido nos seguintes termos: I – sem percepção do benefício emergencial para a redução de jornada e de salário inferior a 25%; II – de 25% sobre a base de cálculo prevista no art. 6º da Medida Provisória 936/2020 (valor mensal do seguro-desemprego a que o empregado teria direito) para a redução de jornada e de salário igual ou superior a 25% e inferior a 50%; III – de 50% sobre a base de cálculo prevista no art. 6º da Medida Provisória 936/2020 (valor mensal do seguro-desemprego a que o empregado teria direito) para a redução de jornada e de salário igual ou superior a 50% e inferior a 70%; IV – de 70% sobre a base de cálculo prevista no art. 6º da Medida Provisória 936/2020 (valor mensal do seguro-desemprego a que o empregado teria direito) para a redução de jornada e de salário superior a 70% (art. 11, § 2º, da Medida Provisória 936/2020). Como se pode notar, a Medida Provisória 936/2020 prevê que o benefício emergencial de preservação do emprego e da renda não é devido para a redução de jornada e de salário inferior a 25% estabelecida por convenção coletiva ou o acordo coletivo de trabalho (art. 11, § 2º, inciso I), em manifesto prejuízo ao empregado, acentuando a perda de renda, com efeitos negativos no consumo e aprofundamento da crise econômica e social. Além disso, a negociação coletiva de trabalho, ao invés de ser incentivada e fomentada, em observância à Constituição da República (art. 7º, inciso XXVI) e à Convenção 98 da Organização Internacional do Trabalho (art. 4º), pelo contrário, é desestimulada e, se exercida, pode penalizar ainda mais o empregado, nos casos de redução de jornada e de salário por meio de convenção ou acordo coletivo em percentual superior àquele previsto para cálculo do benefício emergencial de preservação do emprego e da renda. As convenções ou os acordos coletivos de trabalho celebrados anteriormente podem ser renegociados para adequação de seus termos, no prazo de 10 dias corridos, contado da data de publicação da Medida Provisória 936/2020 (art. 11, § 3º, da Medida Provisória 936/2020). Os acordos individuais de redução de jornada de trabalho e de salário ou de suspensão temporária do contrato de trabalho, pactuados nos termos da Medida Provisória 936/2020, devem ser comunicados pelos empregadores ao respectivo sindicato laboral, no prazo de até 10 dias corridos, contado da data de sua celebração (art. 11, § 4º, da Medida Provisória 936/2020). As medidas de que trata o art. 3º da Medida Provisória 936/2020 serão implementadas por meio de acordo individual ou de negociação coletiva aos empregados: “I – com salário igual ou inferior a R$ 3.135,00; ou II – portadores de diploma de nível superior e que percebam salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social” (art. 12 da Medida Provisória 936/2020). Como se pode notar, segundo essa questionável previsão da Medida Provisória 936/2020, autoriza-se que a redução proporcional de jornada de trabalho e de salários e a suspensão temporária do contrato de trabalho sejam estabelecidas por meio de acordo individual ou de negociação coletiva nos casos de empregados com salário igual ou inferior a R$ 3.135,00 ou de empregados portadores de diploma de nível superior e que percebam salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social. Para os empregados não enquadrados no caput do art. 12 da Medida Provisória 936/2020, as medidas previstas no art. 3º da Medida Provisória 936/2020 somente podem ser estabelecidas por convenção ou acordo coletivo, ressalvada a redução de jornada de trabalho e de salário de 25%, prevista na alínea a do inciso III do caput do art. 7º, que pode ser pactuada por acordo individual (art. 12, parágrafo único, da Medida Provisória 936/2020). Logo, para os empregados com salário superior a R$ 3.135,00 e para os empregados que não sejam portadores de diploma de nível superior e não que percebam salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, a redução proporcional de jornada de trabalho e de salários e a suspensão temporária do contrato de trabalho, em regra, somente podem ser estabelecidas por convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho. Como exceção, mesmo quanto aos referidos empregados, a redução de jornada de trabalho e de salário de 25% pode ser pactuada por acordo individual. Vale dizer, a redução de 25% da jornada de trabalho e de salários pode ser feita por acordo individual para todos os empregados. A redução de 50% e 70% da jornada de trabalho e de salários e a suspensão temporária do contrato de trabalho podem ser feitas por acordo individual para os empregados que recebem valor inferior ou igual a R$ 3.135,00 por mês e para os empregados que sejam portadores de diploma de nível superior e que percebam salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social (ou seja, em 2020, R$ 12.202,12). Esclareça-se que a partir de 1º de fevereiro de 2020, o salário de benefício e o salário de contribuição não podem ser inferiores a R$ 1.045,00, nem superiores a R$ 6.101,06 (art. 2º da Portaria 3.659/2020 do Ministério da Economia). A redução da jornada de trabalho e de salários e a suspensão temporária de contrato de trabalho podem ser pactuadas com todos os empregados por meio de negociação coletiva, dando origem a acordo coletivo ou convenção coletiva de trabalho. Na realidade, não há fundamento lógico que justifique essas diferenciações aleatórias entre empregados, podendo gerar tratamento desigual, ilegítimo e injusto entre trabalhadores que estejam praticamente na mesma condição, recebendo, por exemplo, valores salariais bem próximos, como um empregado que receba salário mensal de R$ 3.135,00 e outro que tenha salário de R$ 3.136,00 por mês. Ademais, a previsão de acordo individual para a redução proporcional da jornada de trabalho e de salário dos empregados, autorizada pela Medida Provisória 936/2020 em certas situações, revela-se inconstitucional. A redução salarial somente é válida se prevista em acordo coletivo ou convenção coletiva (art. 7º, inciso VI, da Constituição da República)2, que são instrumentos normativos decorrentes de negociação coletiva de trabalho, reconhecidos no art. 7º, inciso XXVI, da Constituição Federal de 19883, e não por acordo individual, nem por determinação unilateral do empregador. O art. 503 da CLT4 não está mais em vigor, por não ter sido recepcionado pela atual ordem constitucional, pois facultava ao empregador reduzir, independentemente de negociação coletiva, os salários dos empregados5. A redução da jornada de trabalho, com a manutenção do mesmo valor do salário, ou seja, sem a redução deste, pode ser concedida pelo empregador, da mesma forma que se concede aumento ou reajuste salarial, de modo mais benéfico ao empregado (art. 7º, caput, da Constituição Federal de 1988)6. A redução da jornada de trabalho com redução de salário, entretanto, exige acordo coletivo ou convenção coletiva, conforme art. 7º, incisos VI e XIII, da Constituição Federal de 19887. No plano individual, a redução de salário, ainda que acompanhada de redução da jornada de trabalho, mesmo com a anuência do empregado, também viola o princípio da condição mais benéfica, não sendo válida, por acarretar prejuízo ao empregado8. Nesse sentido, em razão do mencionado princípio, que decorre do princípio da proteção9, inerente ao Direito do Trabalho e que tem fundamento no art. 7º, caput, da Constituição da República, assegura-se ao empregado a manutenção, durante o contrato de trabalho, de direitos mais vantajosos, de modo que as vantagens adquiridas não podem ser retiradas nem modificadas para pior. Trata-se de aplicação do princípio do direito adquirido (art. 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal de 1988) no âmbito da relação de emprego10. Como leciona Arnaldo Süssekind, o mencionado princípio “determina a prevalência das condições mais vantajosas para o trabalhador, ajustadas no contrato de trabalho ou resultantes do regulamento de empresa, ainda que vigore ou sobrevenha norma jurídica imperativa prescrevendo menor nível de proteção e que com esta não sejam elas incompatíveis”11. A preservação do valor do salário-hora de trabalho (art. 7º, inciso I, da Medida Provisória 936/2020) não neutraliza a inconstitucionalidade em destaque, uma vez que no caso de trabalhador mensalista, ou seja, que recebe valor mensal de salário (e não salário calculado por hora, obra, peça ou tarefa), a redução proporcional da jornada de trabalho e de salário por acordo individual, quanto a certos empregados, resultará em valor salarial inferior, em violação direta dos preceitos constitucionais anteriormente indicados. A mera comunicação pelos empregadores ao sindicato laboral dos acordos individuais de redução de jornada de trabalho e de salário ou de suspensão temporária do contrato de trabalho (art. 11, § 4º, da Medida Provisória 936/2020), evidentemente, não supre a exigência de negociação coletiva, por ter natureza de ato unilateral, com o intuito de apenas cientificar. A suspensão temporária do contrato de trabalho, por acarretar a ausência de pagamento de salário no período, na verdade, significa a sua redução a zero durante o mencionado período. Logo, a pactuação dessa suspensão contratual por acordo individual, autorizada pela Medida Provisória 936/2020 em certas situações, também é nitidamente contrária à determinação constitucional de que a redução do salário apenas pode ser estabelecida por meio de convenção coletiva e acordo coletivo de trabalho (art. 7º, inciso VI, da Constituição Federal de 1988). Por se tratar de exceção, a sua interpretação não pode ser ampliativa. Registre-se que a suspensão do contrato de trabalho sem o pagamento de salário é medida até mesmo mais prejudicial do que a redução de parte do salário, confirmando a exigência de negociação coletiva de trabalho, com a presença, em regra, do sindicato dos trabalhadores (art. 7º, inciso XXVI, e art. 8º inciso VI, da Constituição da República)12. A posição divergente sustenta que a situação é de força maior, excepcional e transitória, não prevista nas normas constitucionais indicadas. Nessa linha, seria admissível a previsão de acordo individual para a redução proporcional de jornada de trabalho e de salários e a suspensão temporária do contrato de trabalho, em certas hipóteses, objetivando-se a preservação da ordem econômica e do emprego (art. 170 da Constituição Federal de 1988), com fundamento nos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (art. 1º, inciso IV, da Constituição da República), a fim de se construir uma sociedade livre, justa e solidária, garantir o desenvolvimento nacional e promover o bem de todos (art. 3º, incisos I, II e IV, da Constituição Federal de 1988). Ainda assim, deve-se assegurar percentual mínimo de renda ao trabalhador, para a preservação de sua dignidade (art. 1º, inciso III, da Constituição da República)13. No âmbito do Supremo Tribunal Federal, foi proferida decisão liminar nos seguintes termos: “Isso posto, com fundamento nas razões acima expendidas, defiro em parte a cautelar, ad referendum do Plenário do Supremo Tribunal Federal, para dar interpretação conforme a Constituição ao § 4º do art. 11 da Medida Provisória 936/2020, de maneira a assentar que ‘[os] acordos individuais de redução de jornada de trabalho e de salário ou de suspensão temporária de contrato de trabalho [...] deverão ser comunicados pelos empregadores ao respectivo sindicato laboral, no prazo de até dez dias corridos, contado da data de sua celebração’, para que este, querendo, deflagre a negociação coletiva, importando sua inércia em anuência com o acordado pelas partes” (STF, MC-ADI 6.363/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 06.04.2020). Na decisão proferida em embargos de declaração, estes foram conhecidos, porém rejeitados, entendendo-se pela ausência dos vícios de contradição e omissão, sem prejuízo dos seguintes esclarecimentos que foram explicitados: “Diante de todo o exposto, esclareço, para afastar quaisquer dúvidas, e sem que tal implique em modificação da decisão embargada, que são válidos e legítimos os acordos individuais celebrados na forma da MP 936/2020, os quais produzem efeitos imediatos, valendo não só no prazo de 10 dias previsto para a comunicação ao sindicato, como também nos prazos estabelecidos no Título VI da Consolidação das Leis do Trabalho, agora reduzidos pela metade pelo art. 17, III, daquele ato presidencial. Ressalvo, contudo, a possibilidade de adesão, por parte do empregado, à convenção ou acordo coletivo posteriormente firmados, os quais prevalecerão sobre os acordos individuais, naquilo que com eles conflitarem, observando-se o princípio da norma mais favorável. Na inércia do sindicato, subsistirão integralmente os acordos individuais tal como pactuados originalmente pelas partes” (STF, ED-MC-ADI 6.363/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 13.04.2020). Entretanto, o Pleno do Supremo Tribunal Federal, no julgamento de medida cautelar em ação direta de inconstitucionalidade, decidiu no sentido da validade da previsão da Medida Provisória 936/2020 que autoriza, em certas hipóteses, a redução da jornada de trabalho e de salário ou a suspensão temporária do contrato de trabalho por meio de acordo individual, independentemente de negociação coletiva e da anuência do sindicato. Com isso, por maioria de votos, não foi referendada a medida cautelar que havia sido deferida liminarmente. Prevaleceu o entendimento de que, em razão do momento excepcional e de crise, a previsão de acordo individual é razoável, ao garantir certa renda mínima ao trabalhador e preservar o vínculo de emprego, além do que a exigência de atuação do sindicato, instaurando a negociação coletiva ou não se manifestando no prazo previsto, geraria insegurança jurídica e aumento do risco de desemprego (STF, Pleno, MC-ADI 6.363/DF, Rel. p/ ac. Min. Alexandre de Moraes, j. 17.04.2020)14. A redução proporcional de jornada de trabalho e de salário ou a suspensão temporária do contrato de trabalho, quando adotadas, devem resguardar o exercício e o funcionamento dos serviços públicos e das atividades essenciais de que tratam a Lei 7.783/1989 e a Lei 13.979/2020 (art. 13 da Medida Provisória 936/2020). A respeito do direito de greve, o art. 10 da Lei 7.783/1989 arrola os serviços ou atividades essenciais. Além disso, cabe ao Presidente da República dispor, mediante decreto, sobre os mencionados serviços públicos e atividades essenciais (art. 3º, § 9º, da Lei 13.979/2020, incluído pela Medida Provisória 926/2020). Nesse sentido, o Decreto 10.282/2020 regulamenta a Lei 13.979/2020, para definir os serviços públicos e as atividades essenciais. As irregularidades constatadas pela Auditoria-Fiscal do Trabalho quanto aos acordos de redução de jornada de trabalho e de salário ou de suspensão temporária do contrato de trabalho previstos na Medida Provisória 936/2020 sujeitam os infratores à multa prevista no art. 25 da Lei 7.998/1990 (art. 14 da Medida Provisória 936/2020). O processo de fiscalização, de notificação, de autuação e de imposição de multas decorrente da Medida Provisória 936/2020 deve observar o disposto no Título VII da Consolidação das Leis do Trabalho (arts. 626 a 642), não aplicado o critério da dupla visita e o disposto no art. 31 da Medida Provisória 927/2020 (art. 14, parágrafo único, da Medida Provisória 936/2020). O disposto na Medida Provisória 936/2020 se aplica aos contratos de trabalho de aprendizagem e de jornada parcial (art. 15 da Medida Provisória 936/2020). Essa exclusão certamente decorre das peculiaridades dos referidos contratos de trabalho (arts. 58-A e 428 da CLT), normalmente com modesto patamar remuneratório mensal. O tempo máximo de redução proporcional de jornada e de salário e de suspensão temporária do contrato de trabalho, ainda que sucessivos, não pode ser superior a 90 dias, respeitado o prazo máximo de que trata o art. 8º da Medida Provisória 936/2020, no sentido de que a suspensão temporária do contrato de trabalho tem o prazo máximo de 60 dias, que pode ser fracionado em até dois períodos de 30 dias (art. 16 da Medida Provisória 936/2020). Logo, o prazo máximo de redução proporcional de jornada e de salário é de 90 dias e o prazo máximo de suspensão temporária do contrato de trabalho é de 60 dias.
2.5.Benefício emergencial no contrato de trabalho intermitente O empregado com contrato de trabalho intermitente formalizado até a data de publicação da Medida Provisória 936/2020, nos termos do disposto no § 3º do art. 443 da Consolidação das Leis do Trabalho, fará jus ao benefício emergencial mensal no valor de R$ 600,00, pelo período de três meses (art. 18 da Medida Provisória 936/2020). Considera-se como intermitente o contrato de trabalho no qual a prestação de serviços, com subordinação, não é contínua, ocorrendo com alternância de períodos de prestação de serviços e de inatividade, determinados em horas, dias ou meses, independentemente do tipo de atividade do empregado e do empregador, exceto para os aeronautas, regidos por legislação própria (art. 443, § 3º, da CLT). O referido benefício emergencial mensal será devido a partir da data de publicação da Medida Provisória 936/2020 e deve ser pago em até 30 dias (art. 18, § 1º, da Medida Provisória 936/2020). Aplica-se ao mencionado benefício emergencial mensal o disposto nos § 1º (será custeado com recursos da União), § 6º (será operacionalizado e pago pelo Ministério da Economia) e § 7º (inscrição em dívida ativa da União dos créditos constituídos em decorrência de benefício pago indevidamente ou além do devido) do art. 5º e nos §§ 1º e 2º do art. 6º da Medida Provisória 936/2020 (art. 18, § 2º, da Medida Provisória 936/2020). A existência de mais de um contrato de trabalho nos termos do disposto no § 3º do art. 443 da Consolidação das Leis do Trabalho não gera direito à concessão de mais de um benefício emergencial mensal (art. 18, § 3º, da Medida Provisória 936/2020). Ato do Ministério da Economia disciplinará a concessão e o pagamento do benefício emergencial de que trata o art. 18 da Medida Provisória 936/2020 (art. 18, § 4º, da Medida Provisória 936/2020). O benefício emergencial mensal de empregado com contrato de trabalho intermitente não pode ser acumulado com o pagamento de outro auxílio emergencial (art. 18, § 5º, da Medida Provisória 936/2020). Evita-se, com isso, o bis in idem, para que haja eficiência na utilização dos recursos públicos.
3.Conclusão
O salário é irredutível, salvo previsão em convenção coletiva ou acordo coletivo, o que pode ocorrer, como medida excepcional, justamente em razão de força maior e de conjuntura econômica desfavorável da empresa decorrentes do coronavírus. A redução da jornada de trabalho, se acompanhada de redução salarial, deve ser prevista em instrumento normativo decorrente de negociação coletiva de trabalho.
A Medida Provisória 936/2020 instituiu o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, com aplicação durante o referido estado de calamidade pública e com os seguintes objetivos: preservar o emprego e a renda; garantir a continuidade das atividades laborais e empresariais; reduzir o impacto social decorrente das consequências do estado de calamidade pública e de emergência de saúde pública.
As medidas do referido Programa são o pagamento de benefício emergencial de preservação do emprego e da renda, a redução proporcional de jornada de trabalho e de salários e a suspensão temporária do contrato de trabalho.
Em termos doutrinários, embora a questão seja controvertida, entende-se que a previsão de acordo individual para a redução proporcional da jornada de trabalho e de salário e para a suspensão temporária do contrato de trabalho, autorizada pela Medida Provisória 936/2020 em certas situações, revela-se inconstitucional.
Entretanto, o Pleno do Supremo Tribunal Federal, no julgamento de medida cautelar em ação direta de inconstitucionalidade, reconheceu a validade da previsão da Medida Provisória 936/2020 que autoriza, em determinadas hipóteses, a redução da jornada de trabalho e de salário ou a suspensão temporária do contrato de trabalho por meio de acordo individual.
4.Referências bibliográficas
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TEIXEIRA FILHO, João de Lima. Instituições de direito do trabalho. 18. ed. São Paulo: LTr, 1999. v. 1.
1 “Art. 2º-A. Para efeito do disposto no inciso II do art. 2º, fica instituída a bolsa de qualificação profissional, a ser custeada pelo Fundo de Amparo ao Trabalhador – FAT, à qual fará jus o trabalhador que estiver com o contrato de trabalho suspenso em virtude de participação em curso ou programa de qualificação profissional oferecido pelo empregador, em conformidade com o disposto em convenção ou acordo coletivo celebrado para este fim”. 2 Cf. GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Curso de direito do trabalho. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2020. p. 489. 3 “1. O art. 7º, XXVI, da CF estabelece o reconhecimento dos acordos e das convenções coletivas de trabalho, permitindo inclusive a redução dos principais direitos trabalhistas, concernentes ao salário e à jornada de trabalho, valendo destacar que, no plano internacional, a OIT possui as Convenções 98 e 154 que apontam para a necessidade de que os países membros prestigiem a negociação coletiva como a via mais eficaz de composição de conflitos coletivos de trabalho e fixação das condições de trabalho de cada setor produtivo. 2. Nesse sentido, cabe mencionar as decisões relatadas pelo saudoso Ministro Teori Zavascki, no processo STF-RE-895.759, e pelo Ministro Roberto Barroso, no processo STF-RE 590.415, no sentido de que a Constituição de 1988, em seu art. 7º, XXVI, prestigiou a autonomia negocial coletiva e a autocomposição dos conflitos trabalhistas, acompanhando a tendência mundial ao crescente reconhecimento dos mecanismos de negociação coletiva” (TST, SDC, AIRO-277-95.2015.5.17.0000, Red. Min. Ives Gandra Martins Filho, DEJT 28.11.2019). 4 “Art. 503. É lícita, em caso de força maior ou prejuízos devidamente comprovados, a redução geral dos salários dos empregados da empresa, proporcionalmente aos salários de cada um, não podendo, entretanto, ser superior a 25% (vinte e cinco por cento), respeitado, em qualquer caso, o salário mínimo da região. Parágrafo único. Cessados os efeitos decorrentes do motivo de força maior, é garantido o restabelecimento dos salários reduzidos”. 5 Cf. TEIXEIRA FILHO, João de Lima. Instituições de direito do trabalho. 18. ed. São Paulo: LTr, 1999. v. 1, p. 545; MARTINS, Sergio Pinto. Direito do trabalho. 28. ed. São Paulo: Atlas, 2012. p. 305 e 337; NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Teoria jurídica do salário. 2. ed. São Paulo: LTr, 1997. p. 175; CARRION, Valentin. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 414. 6 Cf. DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 17. ed. São Paulo: LTr, 2018. p. 1049: “Reenfatize-se, é claro, neste debate, que a redução das horas de labor sem redução salarial, por ser medida favorável, seria válida, mesmo inexistindo negociação coletiva” (destaque do original). 7 Cf. DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 17. ed. São Paulo: LTr, 2018. p. 1048: “Em primeiro lugar, é válida, juridicamente, a redução da duração do trabalho, com respectiva redução salarial, desde que coletivamente negociada a medida, correspondendo a uma transação (art. 7º, VI e XIII, CF/88). Em consequência, é inválida, pois, em princípio, redução meramente contratual das horas de labor com redução salarial, ainda que com aquiescência do empregado (princípio da inalterabilidade contratual lesiva; art. 468, caput, CLT; art. 7º, VI, CF/88” (destaques do original). 8 “4. Apresentam-se como princípios reguladores e limitadores da modificação das condições de trabalho o da inalterabilidade contratual lesiva e o da condição mais benéfica. De maneira mais específica, o art. 468 da CLT prevê que, nos contratos individuais de trabalho, só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento e, ainda assim, desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia” (TST, 6ª T., AIRR-11454-30.2017.5.03.0112, Rel. Min. Kátia Magalhães Arruda, DEJT 12.04.2019). 9 Cf. PLÁ RODRIGUEZ, Américo. Princípios de direito do trabalho. 3. ed. Tradução e revisão técnica de Wagner D. Giglio. Tradução das atualizações de Edilson Alkmim Cunha. São Paulo: LTr, 2004. p. 106-107, 131. 10 Cf. MARTINS, Sergio Pinto. A continuidade do contrato de trabalho. São Paulo: Altas, 2000. p. 127-128. 11 SÜSSEKIND, Arnaldo. Instituições de direito do trabalho. 18. ed. São Paulo: LTr, 1999. v. 1, p. 154. 12 Cf. SÜSSEKIND, Arnaldo. Instituições de direito do trabalho. 18. ed. São Paulo: LTr, 1999. v. 1, p. 215: “A Constituição brasileira adotou, embora timidamente, a flexibilização de algumas de suas normas: redutibilidade salarial, compensação de horários na semana e trabalho em turnos de revezamento (art. 7º, VI, XIII e XIV); mas sempre sob tutela sindical”. 13 Cf. CASSAR, Vólia Bomfim. Comentários à Medida Provisória 936/20. Academia Brasileira de Direito do Trabalho, 06 de abril de 2020. Disponível em: [www.andt.org.br/f/COMENT%C3%81RIOS%20%C3%80%20MEDIDA%20PROVIS%C3%93RIA%20936-20.pdf]. Acesso em: 09.04.2020. 14 Cf. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. STF mantém possibilidade de redução de salários por acordo individual em decorrência da pandemia, 17.04.2020. Disponível em: [http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=441651&ori=1]. Acesso em: 17.04.2020.
Gustavo Filipe Barbosa Garcia Livre-Docente pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Doutor em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Pós-Doutorado em Direito pela Universidade de Sevilla. Especialista em Direito pela Universidade de Sevilla. Membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho, Titular da Cadeira 27. Membro Pesquisador do IBDSCJ. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual. Professor Titular do Centro Universitário do Distrito Federal. Professor da Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Advogado. gustavofbg@yahoo.com.br




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