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DIREITO DO CONSUMIDOR: A QUESTÃO DO CARRO RESERVA E A INCONSTITUCIONALIDADE DE LEIS ESTADUAIS

DIREITO DO CONSUMIDOR: A QUESTÃO DO CARRO RESERVA E A INCONSTITUCIONALIDADE DE LEIS ESTADUAIS QUE MODIFICAM O CDC

Ulisses Lyrio Chaves Advogado OAB/PR 35.005 Área do Direito: Consumidor

Em 04 de Junho de 2014 foi promulgada a Lei Estadual de Pernambuco n. 15.304 e em 20 de janeiro de 2015 foi promulgada a Lei Estadual da Paraíba n. 10.434, ambas dispondo sobre obrigatoriedade das montadoras de veículos, por intermédio de sua concessionárias ou importadoras de fornecer carro reserva similar ao do cliente, no caso do carro do carro ficar parado por mais de 15 (quinze) dias (no caso do Estado de Pernambuco) e no caso do carro ficar parado por mais de 5 (cinco ) dias; devido à falta de peças originais. As duas referidas leis dispõem de apenas 3 arts. e seu disposto colide frontalmente com a Lei 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor) que já regular em seu art. 18 sobre a responsabilidade dos fornecedores pelos vícios dos produtos que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo.

A previsão disposta no Art. 24, V e VII da Constituição Federal da União e Estados membros legislem sobre consumo e responsabilidade por dano ao consumidor não autoriza que os estados legislem de forma que conflitem. Essa concomitância é permitida no sentido do estado complementar a lei federal e não sobrepô-la; nem autoriza o Estado a legislar sobre consumo como bem entender.

Vejamos as leis:

"Art. 1º da Lei 15.304/14 "Ficam as montadoras de veículos, por intermédio de suas concessionárias ou importadoras, obrigadas a fornecerem carro reserva similar ao do cliente, no caso do automóvel ficar parado por mais de 15 (cinco) dias por falta de peças originais ou qualquer outra impossibilidade de realização do serviço."

Art. 1º da Lei 10.434/15 "Ficam as montadoras de veículos, por intermédio de suas concessionárias ou importadoras, obrigadas a fornecer carro reserva similar ao do cliente, no caso do automóvel ficar parado por mais de 5 (cinco) dias por falta de peças originais, ou qualquer outra impossibilidade de realização do serviço."

Pela redação vê-se que os Estados de Pernambuco e da Paraíba tratam de prazo de reparo e de responsabilidade do fornecedor, temas já disciplinados no Código de Defesa do Consumidor em seus Art. 18, Paragrafo 1º e Art. 12 Parágrafo 3º, o que causa visível dualidade de leis sobre o mesmo assunto.

Sobre o 'tramite' para o reparo do produto, assim dispõe o Parágrafo Primeiro do Art. 18: "Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.

"§ 1º Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:

I - a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso;

II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;

III - o abatimento proporcional do preço."

Vê-se, de forma clara e precisa que não sendo o vício sanado em trinta dias é facultado ao consumidor ter a substituição do produto, a restituição da quantia paga ou o abatimento do preço.

Portanto, o prazo para o fornecedor sanar um problema do produto é de 30 (trinta) dias, pouco importando se ocorre a falta de peças. Assim, o Art. 1º atropela tema já disposto em lei federal.

Ressalte-se que a lei federal prevê ainda, no Art. 2º, o movimento do prazo para maior ou menor tempo.

"§ 2º Poderão as partes convencionar a redução ou ampliação do prazo previsto no parágrafo anterior, não podendo ser inferior a sete nem superior a cento e oitenta dias. Nos contratos de adesão, a cláusula de prazo deverá ser convencionada em separado, por meio de manifestação expressa do consumidor."

Essa flexibilização bem demonstra a amplitude que uma lei deve ter para abranger as várias situações que se desdobram de uma relação de consumo, dependendo do produto.

Outro gritante conflito causado pelas leis dos Estados de Pernambuco e da Paraíba é a responsabilização do Fornecedor, em novo atropelo ao CDC, agora quanto ao prescrito no Art. 12, Parágrafo 3º:

"Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.

§ 3º O fabricante, o construtor, o produtor ou importador só não será responsabilizado quando provar:


I - que não colocou o produto no mercado;

II - que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste;

III - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro."

Veja que o Art. 1º das leis estaduais também conflita frontalmente com lei federal que prevê excludente de responsabilidade do consumidor; uma vez que a lei estadual simplesmente impõe a responsabilização da montadora sem qualquer graduação, ou seja, "qualquer que seja a impossibilidade de realização do serviço" a montadora é responsável.

É sabido que a lei tem como um de seus princípios básicos a paz social. Essa paz é trazida pela disposição de norma que equilibre a relação entre as partes, considerando seu porte e poder econômico. A Lei 8.078 /90 considera o prazo de 30 dias e mesmo as excludentes de responsabilidade exatamente para causar um balanceamento entra a força da montadora e força do consumidor que tem um código já intitulado que é para sua proteção.

No entanto, as leis estaduais em análise extinguem a figura desse equilíbrio uma vez que atribui um prazo exíguo, sem qualquer arrimo técnico, e ainda desconsiderando a geografia continental do Brasil. Também neste aspecto a Lei 8.078/90 também teve a sensatez de prescrever 30 (trinta) dias para o fornecedor proceder ao reparo do produto. Da mesma forma, a não previsão de isenção de responsabilidade da montadora sob qualquer forma enseja uma ofensa à figura da isonomia na medida em que as montadoras de automóveis estariam sujeitas a uma obrigação legal diversa dos fabricantes de outros produtos, em flagrante ofensa ao Art. 5º da Constituição Federal.

É inquestionável a hipossuficiência do consumidor frente às montadoras, razão pela qual faz todo o sentido a edição de normativos visando assegurar proteção ao consumidor; entretanto, não é através da edição de leis que conflitam com Leis Federais, que já regulam a mesma matéria, que os Estados de PE e PB vão prestar essa proteção. Com toda a certeza existem outras formas de efetivamente se outorgar proteção ao consumidor que não seja através deste conflito gerado pelas Leis 15.304/14 e Lei 10.434/15.

Além da insegurança causada às montadoras e concessionárias, pelas razões acima expostas, no aspecto econômico a consequência é essencialmente financeira na medida em que as montadoras e concessionárias se verão obrigadas a fazer altos investimentos para poderem cumprir a norma. Ocorre que é totalmente descabido se falar em investimentos dessa natureza para um segmento que fechou 2015 com uma retração de 26,6%, no segmento de carros de passeio, e com uma retração de 47,1%, no segmento de caminhões, em comparação com 2014. O que o segmento automotivo menos precisa é de leis que gerem insegurança jurídica e gastos sem adicionais em um momento de recessão econômica.

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